….ataque homofóbico em debate é redução do marco civilizatório….

 
 
 
 
A incitação ao ódio público contra qualquer pessoa, povo ou grupo social não está protegida pela cláusula constitucional que assegura a liberdade de expressão
 
 
 
 
 
Os debates eleitorais vinham desanimados –mas, conseguiram ficar ainda piores.
 
Já faz tempo que os encontros deixaram de ser memoráveis.
 
A participação de um número expressivo de candidatos. O treinamento pelos marqueteiros. Um cipoal de regras que limita os confrontos e o desenvolvimento das ideias.
 
Poucos têm alterado o quadro eleitoral e cada vez menos são notícias no dia seguinte, além dos memes e virais que divertem nas redes sociais.
 
O último exemplo, todavia, foi uma exceção. E uma triste exceção.
 
Nem Dilma, nem Aécio, nem Marina foram seus protagonistas –mas também é uma pena que tivessem deixado de sê-lo, tal como Luciana Genro ou Eduardo Jorge.
 
Quem fez com que o debate se prolongasse na discussão, foi o nanico Levy Fidelix, perpétuo candidato que, neste ano, deixou de lado a histriônica e isolada proposta do aerotrem. 
 
Fidelix foi mais para baixo e talvez saia da eleição com a nota lamentável de um debate, encharcando de violência, onde não se esperava mais que uma figuração.
 
Fidelix utilizou a reposta a Luciana Genro sobre famílias homoafetivas para uma mensagem contundentemente homofóbica. 
 
A grosseria sem tamanho sobre “órgãos excretores e reprodutores”, a confusão maliciosa e perversa entre homossexualidade e pedofilia, a consideração do gay como doente mental, a atribuição de caracteres nocivos como a “falta de vergonha na cara”, e “o negócio é feio”. Por fim, o comando de “enfrentar essa minoria”, sugestivamente, mencionando a própria avenida Paulista, palco de várias agressões a homossexuais.
 
A grotesca mensagem ficou encartada entre outras tantas manifestações dos candidatos, como se fosse uma mera opinião ou expressão livre de uma plataforma política.
 
Teria sido melhor que depois de ouvi-la, os candidatos simplesmente se levantassem e dessem o debate por encerrado; no mínimo, que pautassem suas falas em face desse absurdo. Teria sido muito mais didático do que agressões paralelas ou promessas alternadas entre si.
 
Um candidato a presidente deve ter pulso para repelir qualquer ideia que hostilize a democracia e ensinar a seus liderados os limites do debate.
 
Permitir que o debate eleitoral sirva de rebaixamento ao marco civilizatório é um paroxismo da democracia.
 
Afinal, só quem não tem compromissos reais com a democracia é que pode resumi-la à liberdade de qualquer expressão. 
 
O estado democrático de direito não é apenas a realização da vontade das maiorias; mas a intransigente defesa das minorias, da diversidade e da pluralidade.
 
O pluralismo, fundamento da República, é a razão pela qual a moral não pode ser objeto de apropriação pública, e a igualdade não permite que os agentes do Estado tratem de forma diferenciada qualquer pessoa por sexo, raça, origem social ou mesmo orientação sexual.
 
Não se pode conclamar o ódio pela diferença, a superioridade pela raça ou o preconceito homofóbico como expressões livres na democracia. Porque de fato, elas não o são.
 
Quando se discutiu, no STF, os limites da liberdade de expressão, na canhestra proibição judicial da Marcha da Maconha, Celso de Mello frisou os limites intrínsecos à própria liberdade. 
 
“A incitação ao ódio público contra qualquer pessoa, povo ou grupo social não está protegida pela cláusula constitucional que assegura a liberdade de expressão. Cabe relembrar, neste ponto, a própria Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), cujo Art. 13, § 5º, exclui, do âmbito de proteção da liberdade de manifestação do pensamento, “toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência”.
 
A hesitação quanto à defesa do casamento igualitário, após reclamações do pastor Silas Malafaia, colocou Marina em uma situação de constrangimento. Dilma fez campanha prometendo a criminalização da homofobia que em seu governo, também premido por apoios e vetos evangélicos, não foi capaz de cumprir.
 
Apesar de várias candidatas mulheres à presidência, o tema do aborto está quase interditado no debate, resquício ainda da pauta conservadora da eleição passada, em que o final do primeiro turno se deu entre altares e coroinhas.
 
Mas nem todas essas dificuldades da realpolitik podem permitir que a homofobia, enquanto discurso de rejeição e ódio, tenha os horários eleitorais como transmissores. 
 
O que se trata por aqui é até mais do que igualdade, respeito ou consideração.
 
Toda vez que alguém com poder ou influência assume em alto e bom som que é preciso combater homossexuais, o que estão em jogo são vidas humanas.
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