….Cidadania nos cárceres….

É perturbadora a idéia de que o voto dos presos surpreenda e incomode tanto

Não se sabe quem serão os vencedores das eleições em 2010 pelo Brasil afora. A cidadania, certamente, ficará engrandecida. Depois de décadas de faz de contas e vistas grossas, o TSE resolveu regulamentar o exercício do voto pelos presos provisórios.
Muitos se escandalizaram, inclusive quem devia ter por obrigação a garantia desses direitos. Antes da polêmica, que se esclareça: não há qualquer impedimento legal ao direito de voto a quem está preso provisoriamente, ou seja, sem decisão condenatória definitiva. Pela legislação brasileira, só a condenação definitiva suspende os direitos políticos, não a existência de processos criminais.
O que vinha acontecendo era simplesmente a omissão dos poderes, Judiciário especialmente incluído. Como o preso está recluso e não pode ir até sua seção eleitoral, ficava sem poder votar. O que o TSE já havia regulamentado anteriormente era a possibilidade de criação de seções, onde houvesse um número mínimo de eleitores, mesmo que institucionalizados. Mas quase ninguém cumpria, sendo mais uma recomendação de que um dever.
Neste ano, sob forte pressão de entidades da sociedade civil, o TSE expediu resolução determinando que os tribunais regionais se preparem para colher os votos dos presos provisórios, fazendo alistamentos e recrutando voluntários para servir de mesários (muitos já se apresentaram, vindos da OAB, Defensoria Pública, e de organizações não-governamentais).
A reação foi imediata: juízes, promotores, articulistas do medo e do pânico em geral chamam atenção para os riscos: segurança na entrada do presídio; pressão aos eleitores pelas facções criminosas; constituição de uma bancada de criminosos…Até o risco da tuberculose foi alrdeado.
Se o sistema penitenciário não comporta segurança para ingresso de pessoas livres nos presídios, todos devemos ficar alarmados, pois milhares de familiares visitam os presos semanalmente, sem contar os funcionários que trabalham cotidianamente nas instituições.
Pressões políticas em redutos eleitorais existem por todos os cantos. Não há qualquer indicativo de que o coronelismo carcerário seja mais intenso ou preocupante do que qualquer outro, público ou privado que se espalhe pelo país. Pela falta de tradição, isto nem sequer deve ser sentido.
E se o medo é eleger políticos com passagens criminais, um levantamento dos atuais congressistas nos mostra que os eleitores soltos já estão dando conta deste recado há sucessivas eleições.
Há vários motivos para garantir os direitos de cidadania de quem não os tem legalmente cerceados. Mas o mais importante é justamente este sentido de legalidade: o Estado não pode desrespeitar a lei.
Estender a cidadania só pode render bons frutos –o primeiro deles é fulminar a idéia de que a sociedade pode ser convenientemente dividida em homens de bem e criminosos, assegurando-se direitos apenas aos primeiros.
E se neste processo forem constatados problemas de segurança nas prisões, a eleição também terá servido para alertar a sociedade e, principalmente, a administração penitenciária, de deveres cuja negligência já nos causou inúmeros desserviços.