…Juiz rejeita defesa de Ustra e reitera que anistia não alcançou sequestro…..

 

 

 

 

Decisão afasta morte
presumida e obediência hierárquica

 

 

 

 

 

 

A decisão que segue
foi prolatada pelo juiz federal Helio Egydio de Matos Nogueira. Nela, o
magistrado afasta os argumentos lançados pela defesa e rejeita o pedido de
absolvição sumária, no caso em que CARLOS ALBERTO BRILHANTE USTRA, ALCIDES
SINGILLO e CARLOS ALBERTO AUGUSTO são processados pelo  sequestro de Edgar de Aquino Duarte, em 1971, durante a ditadura militar.

 

Na decisão, o juiz Hélio Nogueira reitera o
entendimento do recebimento da denúncia, quando a inaplicabilidade da Lei da
Anistia, eis que o sequestro em questão, como crime permanente, não cessou até
15.08.1979, perdurando efeitos até data posterior –citando, ainda, o
compromisso de cumprimento das decisões da Corte Interamericana de Direitos
Humanos que o Brasil assumiu ao ratificar a Convenção Americana.

 

O juiz rejeitou também as argumentações de
atipicidade e da existência óbito presumido (que não tem efeitos no âmbito
penal) e reconhecimento da excludente da obediência hierárquica.

 

Ao
fazê-lo, o juiz determinou o prosseguimento do processo, designando os dias de

09,
10 e 11 de dezembro próximo para a oitiva das testemunhas arroladas pelo Ministério
Público.

 

 

Leia
a íntegra da decisão

(extraída do site da Justiça Federal)

 

 

 

Justiça Federal

9ª Vara Criminal – São Paulo

Autos
n.º 0011580-69.2012.403.6181

 

 

 

 

Vistos em decisão.

 

I
– Cuida-se de ação penal movida pelo Ministério Público Federal em face de CARLOS
ALBERTO BRILHANTE USTRA, ALCIDES SINGILLO e CARLOS ALBERTO AUGUSTO, incursos
nas sanções do artigo 148, § 2º do Código Penal.

A
denúncia foi recebida pela decisão de fls. 1143/1149.

Os
réus foram citados (Alcides às fls. 1232/1233; Carlos Alberto Brilhante Ustra
às fls. 1761/1762 e Carlos Alberto Augusto às fls. 1771/1772), bem como
apresentaram as respostas escritas à acusação de fls. 1235/1260, 1301/1328 e
1775/1804, respectivamente.

Sobre
as preliminares suscitadas nas respostas, manifestou-se o Ministério Público
Federal às fls. 1807/1829, que promoveu a juntada dos documentos 1831/1883.

Às
defesas, foi concedida, em respeito ao contraditório, a oportunidade de
manifestação quanto aos documentos juntados pelo órgão ministerial, tendo sido
apresentadas as petições de fls. 1895/1901, 1902/1908 e 1909/1910.

É
o breve relatório. Passo a decidir.

 

1 – Inépcia da denúncia

Carlos
Alberto Augusto sustenta que a denúncia é inepta por não descrever adequadamente
os fatos delituosos, expostos, a seu sentir,  de forma genérica.

Todavia,
ao receber a denúncia (fls. 1101/1142), pela decisão de fls. 1143/1149, este
Juízo expressamente afirmou que a peça acusatória oferecida pelo Ministério
Público Federal preenchia os requisitos formais, dispostos no art. 41 do Código
de Processo Penal.

Cabe,
neste momento, registrar que a exordial descreve os fatos e as imputações de
cada um dos acusados de modo adequado e claro, não procedendo as alegações
defensivas quanto a existência de vícios formais que impeçam o adequado
exercício do direito de defesa.

Os
fatos estão descritos de modo a permitir a correta compreensão da imputação,
apresentando detalhes de datas, dos fatos e conduta de cada um dos réus, tanto
que os réus puderam exercitar suas defesas da forma mais ampla, apresentando
longas respostas escritas à acusação, não sendo o caso de incidência da norma
do art. 395 do Código de Processo Penal.

Confira-se,
nesse senda, julgado do E. Superior Tribunal de Justiça:

“HABEAS CORPUS.
TRANCAMENTO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. FALTA DE JUSTA CAUSA.
NULIDADE. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA.
MOMENTO PRÓPRIO. FUNDAMENTAÇÃO. LEI N. 11.719/2008. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO
PÚBLICO. USO DE DOCUMENTO FALSO. FORMAÇÃO DE QUADRILHA ARMADA. ADULTERAÇÃO DE COMBUSTÍVEL.
SONEGAÇÃO FISCAL. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO
ILEGAL.

1. De acordo com o
entendimento jurisprudencial sedimentado nesta Corte de Justiça e no Supremo
Tribunal Federal, o ato judicial que recebe a denúncia, ou seja, aquele a que se faz referência no art. 396 do
CPP, por não possuir conteúdo decisório, prescinde da motivação elencada no
art. 93, inciso IX, da Constituição da República. Precedentes (AgRg no HC n.
256.620/SP, Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, DJe 1º/7/2013). 2. É apta a denúncia que narra, como na espécie, a ocorrência de crimes em
tese, bem como descreve as suas circunstâncias e indica os respectivos tipos
penais, viabilizando, assim, o exercício do contraditório e da ampla defesa, nos moldes do previsto
no art. 41 do Código de Processo Penal.
3. É inviável o trancamento da ação
penal quando o pleito se baseia em falta de justa causa não revelada de plano,
mas que depende de aprofundada incursão no conjunto fático da demanda. 4. Sob
pena de dupla supressão de instância, incabível concluir pela impossibilidade
de concurso material entre os crimes de falsificação e de uso de documento
falso, inclusive porque o tema referente à aplicação do princípio da consunção
depende de detalhada avaliação do nexo de dependência das condutas ilícitas. 5.
Ordem não conhecida” (HC 133558 – 6ª. T. – Rel. Min. Sebastião Reis Júnior –
DJE 04.0913) (g.n.)

 

De qualquer modo, e tão-somente para
argumentar, não caberia ao Juízo, após receber a denúncia, reconhecer sua
inépcia, sob pena de estar equivocadamente concedendo habeas corpus de ofício contra si mesmo. Conforme acertadamente já
julgou o E. Tribunal Regional Federal da 3a. Região:

 

“PROCESSUAL
PENAL. DENÚNCIA QUE DESCREVE FATO DEFINIDO COMO CRIME. RECEBIMENTO PELO JUÍZO “A
QUO”. RECONSIDERAÇÃO DA DECISÃO. CONCESSÃO DE “HABEAS CORPUS” DE OFÍCIO PARA
TRANCAR A AÇÃO PENAL. INADMISSIBILIDADE.

Não
poderia o juízo “a quo” ter concedido a ordem de “habeas corpus” contra si
mesmo, eis que, se existia coação ilegal, a autoridade coatora seria o próprio
magistrado, que tinha recebido a denúncia e presidido o feito.

Inobservância
do rito procedimental obrigatoriamente disciplinado pela lei” (RSE n°
94.03.039792-6, Rel. Desembargador Federal André Nabarrete, DJ de 27.02.96, p.
9904)

 

Portanto,
rejeito a alegação de inépcia da denúncia.

 

2 – Ausência de notificação
prévia, nos termos do art. 514 do CPP

Carlos
Alberto Brilhante Ustra levanta a tese de nulidade da ação penal pela
inobservância do disposto no art. 514 do CPP.

Contudo,
a tese não prospera.

O
acusado não se encontra mais no exercício da função  pública, inexistindo razão para a instauração
da fase prévia estabelecida no art. 514 do CPP.

Segundo
ensinamentos de Guilherme de Souza Nucci:

Funcionário que deixa a função: não mais se aplica o
procedimento especial previsto neste capítulo. Ainda que se invoque a proteção
à imagem da administração pública, para que a defesa preliminar seja realizada,
não vemos sentido nisso. Note-se que a tendência atual é de restringir os
procedimentos e foros especiais, justamente o que levou o Supremo Tribunal
Federal a revogar a súmula 394, considerando haver foro privilegiado ao
funcionário, ainda que deixasse o cargo, bastando o cometimento do delito no
exercício da função. É o melhor a seguir.” (Código de Processo Penal Comentado,
3ª ed. RT, p. 793)

 

De
outra banda, imputa-se ao réu a prática do delito de sequestro qualificado
(art. 148, § 2º, do CP), que não possui natureza de delito funcional típico e, portanto,
afasta a incidência da regra do art. 514 do CPP.

Neste
sentido:

“I –
A providência prevista no art. 514 do
CPP diz com os delitos funcionais próprios em que a condição de funcionário é
elementar do tipo (delito especial próprio) não tendo aplicação quando se trata
de delito funcional impróprio (delito especial impróprio) no qual a condição de
funcionário atua como majorante ou qualificadora (v.g. arts. 150 § 2º, 151 § 3º
e 295 do CP)”

(STJ,
Resp 271.397, rel. Min. Félix Fischer, j. 23.04.2002)

Desse modo, não acolho a preliminar de nulidade
suscitada pelo réu Carlos Alberto Brilhante Ustra.

 

3 –
Efeito Vinculante da ADPF 153 e a Lei de Anistia (Lei nº 6.683/79)

Sustentam os réus Carlos Alberto Brilhante
Ustra e Alcides Singilo que a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal
na ADPF nº 153, que declarou válida e vigente a Lei da Anistia (Lei 6.683/79)
possui efeito vinculante e, portanto, estaria extinta a punibilidade dos réus
quanto aos fatos a eles atribuídos neste processo.

Argumentaram, ainda, os referidos réus e
também o corréu Carlos Alberto Augusto, que a Lei n.º 6.683/79 declarou a
anistia dos fatos perpetrados no período de 02.09.1961 e 15.08.1979, alcançando
os fatos delitivos tratados nesta ação penal.

De início cumpre reavivar o exposto por este
Juízo na decisão de recebimento da denúncia (fls. 1143/1149):

“Isto posto, impende
observar que uma das características da transição política do Brasil,
diferentemente de outras experiências continentais, é a ausência de punição dos
agentes estatais envolvidos nos excessos perpetrados durante o período de
repressão política vez que delitos como homicídios e lesões corporais, entre
outros, foram albergados pela chamada Lei da Anistia (Lei n.º 6.683/79), aliás,
considerada constitucional pelo STF no julgamento da Argüição de Descumprimento
de Preceito Fundamental (ADPF n.º 153/DF) promovida pelo Conselho Federal da
OAB.

No entanto, levando
em conta a natureza do delito de seqüestro que se protrai no tempo e se
prolonga até hoje, somente cessando quanto a vítima for libertada, se estiver
viva, ou seus restos mortais forem encontrados, não se aplicado, pois, aqui as
disposições da chamada Lei da Anistia, concedida àqueles que no período de
02/05/1961 a 15/08/1979 perpetraram crimes político ou conexos a estes.

Com efeito, e como se
verá a seguir, a vítima desapareceu enquanto permanecia em poder dos órgãos de
repressão estatal e seu corpo jamais foi encontrado sendo lícito presumir, no
limiar da ação penal, em que vigora a presunção “pro societate”, que foi detida
e seqüestrada e que a supressão de sua liberdade perdure até a data de hoje.”

 

Com
efeito, a Lei nº 6.683/79 delimitou expressamente o lapso temporal de alcance
dos fatos que seriam anistiados: 02.09.1961 a 15.08.1979 (art. 1º caput).

Por
sua vez, o delito objeto da presente ação penal não se limitou a este período e
extrapolou as balizas da Lei de Anistia, conforme já reconhecido por este Juízo
quando do recebimento da denúncia.

Por
conseguinte, uma vez que o delito atribuído aos réus, apesar de iniciado no
período compreendido pela citada lei, não cessou até 15.08.1979, perdurando,
segundo elementos constantes dos autos e já apontados por este Juízo (fls.
1143/1149), imperioso reconhecer que a anistia não alcança os fatos tratados
nestes autos.

Não
se desconhece o efeito vinculante das decisões proferidas em sede de controle
concentrado de constitucionalidade, como é o caso da ADPF nº 153, por expressa
disposição legal (art. 10, § 3.º, Lei nº 9.882/99[1]).

Contudo,
o julgamento da referida Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental
reconheceu a validade e vigência da Lei nº 6.683/79, que, conforme já destacado
e, em razão da natureza permanente do delito de seqüestro, que perdurou após
15.08.1979, não incide na presente hipótese. Vale dizer, o crime permanente
irrogado aos réus continua sendo executados após 1979, e assim estão eles
excluídos do benefício excepcional da anistia, por extrapolarem os marcos
temporais estabelecidos pela própria lei de regência (Lei nº 6.683/79),
incidindo, aqui, a mesma ratio do
enunciado da Súmula nº 711 do Supremo Tribunal Federal.

Dessa
forma, improcedem as alegações das defesas quanto à ocorrência de anistia do
delito imputado aos réus na presente ação penal.

 

4 – Precedentes
jurisprudenciais

A
Defesa comum de Carlos Alberto Brilhante Ustra e Alcides Singilo invoca a
existência de decisões judiciais em outros processos, cíveis e criminais, nos
quais a responsabilidade dos réus por fatos relacionados à época do regime
militar não foi reconhecida.

Neste
sentido, cita o processo criminal nº 0004204-32.2012.403.6181, distribuído ao
Juízo da 10ª Vara Federal Criminal desta Subseção Judiciária, cuja denúncia foi
rejeitada e o recurso em sentido estrito interposto pelo órgão ministerial
improvido pelo E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região.

Destaca,
também, a ação civil pública nº 0011414-28.2008.403.6100, distribuída ao Juízo
da 8ª Vara Federal Cível desta Subseção Judiciária, a qual tinha como objeto a
reparação regressiva dos danos suportados pelo Tesouro Nacional em decorrência
de indenizações pagas nos termos da Lei nº 9.140/95.

Porém,
as decisões favoráveis aos réus nesses processos não vinculam este Juízo e a
presente ação penal.

Cumpre
destacar que a ação civil quer reconheça a existência de um fato, quer declare
a sua inexistência, não produz efeito na esfera penal, em função da autonomia
das instâncias (art. 935 do Código Civil).

A
legislação, por seu turno, expressamente reconhece que a sentença penal
condenatória produz efeitos no âmbito cível, tornando “certa a obrigação de
indenizar o dano causado pelo crime” (art. 91 do Código de Processo Penal).

Esse
preceito ganhou maior efetividade com a edição da Lei n.º 11.719/2008 que
alterou a redação do inc. IV do art. 387 do Código de Processo Penal,
estabelecendo que o magistrado ao proferir sentença condenatória “fixará o
valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração…”.

Do
mesmo modo, a decisão proferida por Juízo Criminal de mesmo grau de jurisdição
em processo sobre fatos distintos, ainda que de mesma natureza, não possui
poder algum de vinculação.

Assim,
a rejeição da denúncia proferida pelo Juízo da 10ª Vara Federal Criminal no
processo nº 0004204-32.2012.403.6181, confirmada pelo Tribunal Regional Federal
da 3ª Região, de forma não unânime, mas ainda sem notícia de trânsito em julgado,
não produz qualquer efeito no presente processo, que é totalmente distinto
daquele.

Veja-se
que naquele processo, um dos argumentos utilizados para rejeitar a denúncia foi
o fato da vítima ter cerca de noventa anos de idade, superando a expectativa de
vida dos brasileiros, segundo dados do IBGE.

Ocorre
que no presente caso a vítima Edgar de Aquino Duarte, nasceu em 28.02.1941,
possuindo atualmente 72 anos de idade, dentro das expectativas de vida e
inferior às idades dos réus Carlos Alberto Brilhante Ustra e Alcides Singillo.

Em
contrapartida, há que se destacar a existência de inúmeras decisões, inclusive
da Corte Interamericana de Direitos Humanos – CIDH, reconhecendo o dever do
Estado brasileiro em investigar os delitos relacionados à época do regime
militar.

Mais
uma vez vale rememorar a decisão de recebimento da denúncia, onde este Juízo
destacou julgado da CIDH, que considerou o Estado brasileiro culpado por
desaparecimento forçado de militantes políticos da chamada “Guerrilha do
Araguaia” (fls. 1144v/1146v).

Além
do já destacado naquela decisão, vale transcrever o seguinte trecho da sentença[2]
proferida pela CIDH no citado caso:

256.  No Capítulo VIII da presente Sentença, a Corte
declarou a violação dos direitos às  garantias judiciais e à  proteção judicial,  em 
virtude da  falta  de 
investigação, julgamento
e eventual sanção dos responsáveis pelos fatos do presente caso. Tomando em consideração o anteriormente
exposto, bem como sua jurisprudência, este Tribunal dispõe que o Estado deve conduzir
eficazmente a investigação penal dos fatos do presente     caso,    
a     fim     de    
esclarecê-los, determinar     as correspondentes
responsabilidades penais
e aplicar efetivamente as sanções e consequências que a lei disponha. Essa obrigação deve ser
cumprida em um prazo razoável, considerando os critérios determinados para
investigações nesse tipo de caso, inter alia:”

 

O
caso citado, apesar de referir-se à denominada “Guerrilha do Araguaia”, guarda
relação com a situação tratada nestes autos, uma vez que, tal como ocorrido e
reconhecido pela CIDH, tem-se a verificação de sequestro de pessoas, até hoje
sem paradeiro identificado, tendo sido o Brasil condenado pela Corte a proceder
à adequada apuração e responsabilização dos autores dos fatos.

O
Brasil, ao ratificar e promulgar a Convenção Americana de Direitos Humanos,
aderiu à competência da Corte Interamericana de Direitos Humanos e, por
conseguinte, assumiu o compromisso de cumprimento das decisões por ela
proferidas:

“ARTIGO 68

1. Os Estados-Partes
na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que
forem partes.”

 

O
Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992, que promulgou a Convenção Americana
sobre Direitos Humanos, inserindo-a no ordenamento brasileiro, estabelece em seu
art. 1º:

“Art. 1° A Convenção Americana sobre
Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), celebrada em São José da
Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, apensa por cópia ao presente decreto, deverá ser cumprida tão inteiramente como
nela se contém
.” (destaquei)

 

Portanto,
a partir do momento em que o Estado brasileiro foi condenado pela Corte
Interamericana de Direitos Humanos a apurar adequadamente os fatos relacionados
à chamada “Guerrilha do Araguaia”, deve não só cumprir a determinação da Corte,
mas, diante do indicativo em que se constitui referida decisão, apurar também todos
os demais fatos de seqüestro de pessoas decorrente da oposição ao regime de
exceção, como é o caso dos autos.

Ainda
sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Extradição nº 974 expôs:

“…No entanto, subsiste a questão
do sequestro. Este está previsto – tem dupla tipicidade – no Tratado que firmamos no âmbito do Mercosul. E todos nós sabemos, embora tenham
passado mais de trinta e oito anos do fato
imputado ao extraditando, as vítimas
até hoje não apareceram, nem tampouco os respectivos corpos, razão pela qual não se pode cogitar, por
ora, de homicídio.

Esses  sequestros 
podem,  em  tese, 
ainda  subsistir. Portanto, estamos diante de um crime
de caráter permanente.

Por essas singelas razões, pelo meu
voto,  defiro a extradição, em parte, nos termos do
parecer da Procuradoria.” (trecho do voto do Ministro Ricardo Lewandowski)

 

A
tese foi reafirmada na Extradição nº 1.150:

“…Todavia,
cumpre salientar que não ocorreu a prescrição da pena referente ao crime de ‘desaparecimento forçado de pessoas’ ou de ‘sequestro
qualificado’, sob a análise da legislação de ambos os Estados.

O parecer
ministerial guarda perfeita consonância com a jurisprudência
deste Supremo Tribunal Federal, no sentido de que o crime de
sequestro qualificado tem natureza permanente e, por isso, o prazo
prescricional começa a fluir a partir da cessação da permanência, não da data
do início do sequestro.

Neste
sentido, por exemplo, a Extradição n. 974, Relator o Ministro Marco Aurélio, Redator para o
acórdão o Ministro Ricardo Lewandowski, de cuja ementa consta:

‘EMENTA: EXTRADIÇÃO, ARGENTINA. TRATADO BILATERAL. ATENDIMENTO AOS REQUISITOS FORMAIS. ADITAMENTO QUANTO AO CRIME DE SEQUESTRO DE MENOR. DUPLA TIPICIDADE.
CONFIGURAÇÃO
PARCIAL. PRESCRIÇÃO.. INOCORRÊNCIA.
PEDIDO EXTRADICIONAL
PARCIALMENTE DEFERIDO. I –
O Decreto 2,003/89, expedido
pelo Governo da Argentina,
foi declarado ‘inconstitucional pela Corte
Suprema de Jtt$ticia de La Nación, em 25/7/2006, razão pela qual não se presta à afastar o. exame das condutas supostamcnte cometidas pelo extraditando.
II- Crime de
sequestro de menor que, em tese, ‘subsiste.
III – Delito que’encontra correspondência no ordenamento jurídico pátrio, IV
– Extradição deferida cm parte’ (DJ 4.12.2009).

Do parecer
do Ministério Público, naquele caso, excerto aplicável à espécie, verbis:

‘(…) Em relação ao sequestro não há que se falar
em prescrição,
pois se trata de crime permanente tanto no Brasil como na Argentina.
Nesse caso, o resultado delituoso se protrai no’tempo enquanto a
vítima, estiver privada de sua liberdade e o prazo prescricional só terá início
após a interrupção da ação do agente.
                                                                              •

De acordo com as informações prestadas pelo Estado requerente, o extraditando
participou do sequestro de diversas pessoas,
principalmente em 1976, ns quais não foram
libertadas até os dias de hoje. A despeito
do tempo decorrido, não se pode afirmar que estejam mortas porque seus corpos jamais foram
encontrados, de modo que . ainda
subsiste a ação perpetrada pelo extraditando (…)’. (trecho do voto da
Ministra Carmém Lúcia)

 

Portanto,
além das ações citadas pelas defesas não constituírem precedentes idôneos a
influenciar a presente ação penal, os julgados da Corte Interamericana de
Direitos Humanos e as Extradições apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal,
demonstram a viabilidade da instauração da presente ação penal.

Em
consequência, indefiro os pedidos
defensivos.

 

5 – Ilegitimidade passiva

Sustenta
o réu Carlos Alberto Brilhante Ustra ser parte passiva ilegítima, sob o
argumento de que a denúncia afirma que a vítima Edgar foi transferida para o
DEOPS/SP em 1972.

Não
procede, porém, o argumento.

Ao
réu imputa-se a conduta de ter, sob o seu comando, privado ilegalmente a liberdade
da vítima Edgar de Aquino Duarte, inicialmente na sede do DOI-CODI-SP e,
posteriormente nas dependências do DEOPS/SP e, por fim, em local ignorado (fls.
1130).

O
fato de ter ocorrido a transferência da vítima de local, por si só, não afasta
a imputação. Pelo contrário, ela se robustece, pois, fosse conhecido o
paradeiro da vítima, seria possível a cessação a privação da liberdade ilegal.

 

6 – Inexistência da provas

Carlos
Alberto Brilhante Ustra e Alcides Singillo afirmam inexistir prova dos fatos narrados
na inicial, argumentando que os depoimentos de presos à época dos fatos não servem
como prova, pois prestados com o intuito de negar confissões, fins eleitoreiros
e visando obtenção de indenizações.

Porém,
conforme já reconhecido por este Juízo ao receber a exordial acusatória, há
lastro probatório suficiente para a instauração da ação penal, sendo certo que
nesta fase preambular da ação vigora o princípio in dubio pro societate[3].

Por
conseguinte, estando a denúncia embasada em conjunto probatório demonstrador da
justa causa para a ação penal, calcada em prova testemunhal e documental, indefiro os pedidos defensivos.

 

7 – Irretroatividade do
crime de tortura

Carlos
Alberto Brilhante Ustra e Alcides Singillo sustentam, ainda, a irretroatividade
do crime de tortura, sob o argumento de que a tipificação do referido delito
somente passou a existir no ordenamento brasileiro com a lei nº 9.455/97.

Todavia,
por óbvio, a denúncia não imputa aos réus o delito de tortura, mas sim o delito
de sequestro qualificado por maus-tratos, não se confundindo com o crime de
tortura tipificado pela Lei nº 9.455/97.

Assim,
não procedem as alegações defensivas, razão pela qual não acolho tal pretensão.

 

8 – Ausência de
razoabilidade pela inexistência de prova quanto ao seqüestro perdurar até os
dias atuais

Os
acusados Carlos Alberto Brilhante Ustra e Alcides Singillo argumentam, ainda,
que não existe razoabilidade em considerar que o seqüestro persiste até os dias
atuais.

No
item 4 supra transcrevi trecho de voto proferido pelo Ministro do STF, Ricardo
Lewandowski, no julgamento da Extradição nº 974, que se aplica ao argumento
defensivo e afasta plenamente a tese sustentada, razão pela qual, em que pese a
repetição, colaciono novamente:

“E todos nós sabemos, embora tenham passado mais de trinta e oito anos do fato imputado ao
extraditando, as vítimas até hoje não
apareceram, nem tampouco os respectivos corpos, razão pela qual não se pode cogitar, por ora, de homicídio.

Esses  sequestros  podem, 
em  tese,  ainda 
subsistir.
Portanto, estamos diante de um crime
de caráter permanente
.”

 

Portanto,
não se pode cogitar em ausência de razoabilidade, tendo em vista que o próprio
STF, analisando situação análoga, considerou a possibilidade de persistência do
seqüestro.

Desse
modo, não acolho, também neste tópico, a tese defensiva.

 

9 – Ausência de prova do
desaparecimento forçado da vítima

Sustenta
Carlos Alberto Augusto que no documento de fls. 100/103 dos autos consta a
informação de que a vítima Edgard de Aquino Duarte, em 12.10.1976, estava
asilado e refugiado em Cuba e, por essa razão, afasta o seqüestro.

O
documento indicado pela defesa é intitulado de fichário provisório individual,
do DOPS, no qual consta (fls. 101):

“Em 26/11/76- Conf.
Enctº nº 552-SI/SR/DPF/PR de 12/10/76 o fichado é asilado e refugiado
brasileiro em Cuba. É solicitado comunicar com urgência o seu retorno ao País.
(V/P-Procurados, 76).”

 

No
item imediatamente subseqüente consta:

“Em 16/01/79- Conf.
Gazeta do Povo de 11/01/79 o fichado figura entre os presos políticos
desaparecido, em lista divulgada pelo Comitê Brasileiro pela Anistia.
(V/P-Comite Brasileiro pela Anistia).”

 

Vê-se
que do mesmo documento constam informações contraditórias.

Houvesse
certeza de que a vítima estava no ano de 1976 em Cuba, inexistiria razão para
constar de seu fichário informação fundada em lista do Comitê Brasileiro pela
Anistia no sentido de que era preso político.

Assim,
a informação de que Edgard encontrava-se em Cuba em 1976 não demonstra a
certeza necessária para afirmar que a essa época não estava mais seqüestrado em
poder dos acusados.

Além
disso, estivesse a vítima efetivamente em Cuba, algum contato com amigos ou
familiares teria ocorrido ou, ao menos, o Comitê Brasileiro pela Anistia teria
obtido essa informação, retirando-o da lista de desaparecidos.

Note-se
que a prova da prisão ilegal da vítima encontra-se fundada em documentos, e
também em diversos depoimentos de presos políticos, não podendo ser dada
guarida à alegação defensiva de que a desconsideração do que consta no documento
de fls. 100/103 configuraria desequilíbrio processual, uma vez que, conforme já
afirmado, o mesmo documento é contraditório e não encontra ressonância em nenhum
outro elemento dos autos restando, portanto, insulado no acervo probatório e
sem força suasória para arredar a tese acusatória.

Por
fim, como bem anotou o órgão ministerial em sua manifestação de fls. 1807/1829:

“…Infelizmente esse
tipo de informação de contrainteligência ocorre até os dias atuais, visando
excluir a responsabilidade dos militares. Recentemente a Advocacia Geral da
União afirmou que, segundo ‘notícias’, alguns dos desaparecidos do Araguaia ainda
estavam vivos.

Deve-se verificar que
é intuitiva a diferença entre uma informação de inteligência – ou
contrainteligência – e a ficha individual noticiando a prisão da vítima,
constante de fls. 320, em que além de se fazer
menção à prisão
de Edgar, consta
foto e impressões digitais.
Não se trata de escolher as provas que
interessam ao MINISTÉRIO PÚBLICO, mas apenas demonstrar que nem todos os
documentos possuem o mesmo valor probatório.”

 

Desse
modo, não acolho a pretensão defensiva.

 

10 – Comissão da verdade
como sede adequada para apuração dos fatos

Suscita
a defesa de Carlos Alberto Augusto, no que foi corroborada posteriormente pelas
defesas dos corréus (fls. 1895/1901 e 1902/1908), que a sede adequada para a
apuração dos fatos tratados nestes autos seria a Comissão da Verdade
instituída, no âmbito federal pela Lei nº 12.528/2011, e, em âmbito estadual,
pela Resolução nº 879/2012 da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.

Contudo,
as Comissões instituídas para conhecer e revelar os fatos ocorridos durante o
regime militar possuem cunho exclusivamente histórico e para fins de registro
da memória do país, não possuindo poder jurisdicional.

A
propósito a Lei nº 12.528/2011 é expressa:

Art. 4º
(…)

§ 4o 
As atividades da Comissão Nacional da Verdade não terão caráter jurisdicional
ou persecutório.

 

Portanto,
uma vez que as Comissões da Verdade não possuem poder jurisdicional – aliás se
o possuíssem constituiriam verdadeiros Juízos de Exceção, vedados pela
Constituição Federal (art. 5º, inc. XXXVII) – a sede adequada para o exercício
da ação penal é o Juízo Criminal.

Não
há qualquer impropriedade entre as atividades da Comissão da Verdade e da
Justiça Criminal, que exercem funções distintas e atuam com objetivos
distintos. Ademais, e como bem explanado pelo Parquet Federal, não poderia a lei excluir da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça à direito (CF, art. 5º, inc. XXXV).

Portanto,
não procede a tese defensiva, que urge ser rejeitada.

 

11 – Aplicação do brocardo nemo potest venire contra factum proprium

Argumenta
a defesa de Carlos Alberto Augusto que o Estado Brasileiro, após o encerramento
do regime militar, não demonstrou a “intenção de se proceder à perseguição
penal das pessoas que fizeram parte de um sistema jurídico que deixaria de
existir, visando à implementação da chamada democracia”.

Ora,
se por um lado não houve manifesta intenção, por outro, não houve demonstração
em negar a apuração dos fatos não alcançados pela Lei nº 6.683/79 (Lei da
Anistia).

Conforme
já exposto na presente decisão (item 3), a Lei de Anistia não alcançou os fatos
deduzidos na denúncia da presente ação penal e, uma vez que persistem até hoje,
não há qualquer impedimento para sua apuração, não constituindo o exercício da
ação penal pelo Ministério Público Federal contradição alguma com as intenções
do Estado brasileiro.

Por
conseguinte, não acolho a tese defensiva.

 

12 – Inconstitucionalidade
do Direito Penal do inimigo

A
defesa de Carlos Alberto Augusto traz aos autos a argumentação de que o
presente processo constitui flagrante inconstitucionalidade por aplicar o chamado
“direito penal do inimigo”

De
início, cumpre registrar que o denominado “direito penal do inimigo’ não se
baseia em fatos, mas sim na pessoa do agente.

Toma
a personalidade do agente e o perigo que ele representa para a sociedade,
antecipando a atuação do direito penal, colocando o sujeito à margem do meio
social.

De
um lado tem-se o direito penal do fato, que parte da prática de um delito para
aplicar uma punição ao agente. De outro, tem-se o direito penal do autor
(inimigo), no qual o agente é punido pelo que ele é e pelo perigo que ele
proporciona à sociedade.

“…Por isso, o
Estado moderno vê no autor de um fato – de novo, uso esta palavra pouco exata –
normal, diferentemente do que ocorre nos teóricos estritos do contratualismo de
Rosseau e de Fichte, não um inimigo que há de ser destruído, mas um cidadão,
uma pessoa que, mediante sua conduta, tem danificado a vigência da norma e que,
por isso, é chamado – de modo coativo, mas como cidadão (e não como inimigo) –
a equilibrar o dano, na vigência da norma. Isto se revela com a pena, quer
dizer, mediante a privação de meios de desenvolvimento do autor, mantendo-se a
expectativa defraudada pelo autor, tratando esta, portanto, como válida, e a
máxima da conduta do autor como máxima que não pode ser norma.

(…)

Portanto, o Direito
Penal conhece dois pólos ou tendências em suas regulações. Por um lado, o
tratamento com o cidadão, esperando-se até que se exteriorize sua conduta para
reagir, com o fim de confirmar a estrutura normativa da sociedade, e por outro,
o tratamento com o inimigo, que é interceptado já no estado prévio, a quem se
combate por sua periculosidade.”[4]

 

Além
disso, o invocado “direito penal do inimigo” tem como características:

“Segundo Jakobs, o
Direto Penal do inimigo se caracteriza por três elementos: em primeiro lugar,
constata-se um amplo adiantamento da punibilidade, isto é, que neste âmbito, a
perspectiva do ordenamento jurídico-penal é prospectiva (ponto de referência: o
fato futuro), no lugar de – como é o habitual – retrospectiva (ponto de
referência: fato cometido). Em segundo lugar, as penas previstas são
desproporcionalmente altas: especialmente, a antecipação da barreira de punição
não é considerada para reduzir, correspondentemente, a pena cominada. Em
terceiro lugar, determinadas garantias processuais são relativizadas ou
inclusive suprimidas.

(…)

Por isso propor-se-ão
duas diferenças estruturais (intimamente relacionadas entre si) entre Direito
Penal do inimigo e Direito Penal: a) o Direito Penal do inimigo não estabiliza
normas (prevenção geral positiva), mas demoniza (igual exclui) a determinados
grupos de infratores; b) em consequência, o Direito Penal do inimigo não é um
Direito Penal do fato, mas do autor.”[5]

 

Retornando
ao presente processo, após essas breves considerações sobre o chamado “Direito
Penal do inimigo”, temos a conclusão que não há qualquer semelhança entre o
preconizado por essa vertente do direito penal com os elementos que constituem
a presente ação penal.

A
denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal no presente processo está
fundada em fatos, certos e determinado, especificando a conduta de cada um dos
acusados.

A
personalidade dos denunciados não foi considerada como elemento norteador da
acusação, tampouco a decisão deste Juízo tomou essa circunstância como
fundamento para a instauração da ação penal.

Não
há previsão de pena desproporcional.

Ademais,
estão sendo estritamente assegurados todos os meios de defesa aos réus, não se
podendo falar em relativização de garantias constitucionais.

Portanto,
as alegações defensivas não encontram a mínima ressonância nos autos e por esta
razão as rejeito de pronto.

 

13 – Ausência de justa causa
por inexistência de tipificação

Neste
tópico, a defesa de Carlos Alberto Augusto apresenta extensa argumentação sobre
o princípio da legalidade para afirmar que os fatos tratados na denúncia não
encontram tipificação na legislação pátria. Alega que a Corte Interamericana de
Direitos Humanos ao apreciar o caso Gomes
Lund e outros
decidiu de forma oposta à pretensão do órgão ministerial,
pois considerou os fatos como desaparecimento forçado, o que difere do
seqüestro.

Em
que pese o esforço defensivo, a argumentação não merece guarida.

Na
decisão de recebimento da denúncia (fls. 1143/1149), restou consignado:

“Embora o Brasil
tenha aprovado a Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de
Pessoas (Convenção de Belém do Pará) através do Decreto Legislativo n.º
127/2011, ainda não há, no ordenamento jurídico a tipificação desta conduta.
Segundo o artigo 2º do referido tratado: “(…) entende-se por desaparecimento forçado a privação de liberdade de uma
pessoa ou mais
pessoas, seja de que
forma for, praticada por agentes do Estado ou por pessoas ou grupo de pessoas
que atuem com autorização, apoio ou consentimento do Estado seguida de falta de
informação ou da recusa a reconhecer a privação de liberdade ou a informar
sobre o paradeiro da pessoa, impedindo assim o exercício dos recursos legais e
das garantias processuais pertinentes.

Entretanto, o E. STF,
adotando a mesma solução para o crime de conspiração, equiparando-o ao delito
de quadrilha ou bando (Extradição nº 1122/Estado de Israel, Relator Min. Ayres
Britto, j.21/05/09), em casos como do Major Manuel Juan Cordeiro Piacentini
(Extradição nº 974. Rel. Min. Ricardo Lewandowiski, j. 26/08/09) e do Major
Norberto Raul Tozzo (Extradição nº 1150, Rel. Min. Carmem Lúcia, j.
19/05/2011), autorizou suas extradições para a República da Argentina, por
crimes cometidos na década de 1970, desconsiderando o “nomen juris” do delito,
por entender que o desaparecimento forçado, naquelas hipóteses, equipava-se ao
crime de seqüestro (artigo 148 do Código Penal), ora imputados aos denunciados,
havendo, pois o requisito da dupla tipicidade.”

 

Na
referida Extradição 1150, sobre a tipificação, o Supremo Tribunal Federal
afirmou:

“4. Também está satisfeito o
requisito da dupla tipicidade, previsto no art. 77, inc. II,
da Lei n. 6.815/80.”

Pelo Código Penal argentino, aquele
que a) matar alguém, com “aleivosia” e “concurso premeditado” de
duas ou mais pessoas, será punido com pena de “reclusão perpétua ou prisão
perpétua”
(Art. 80, incs. 2º e 6º); e b) de
maneira ilegal “priva[r] a outro de sua liberdade pessoal” por
um período
superior a “um mês”, será punido com pena de “prisão
ou reclusão
de dois a seis anos” (arts. 141 e
142, inc. 5º)”.

Pela legislação, brasileira, os
fatos imputados ao Extraditando contém elementos, que configuram, em tese, os crimes de. homicídio qualificado e sequestro qualificado, cujas condutas consistem em “[m]atar alguém (…) à traição, de
emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso
que dificulte ou torne impossível a
defesa do ofendido”,
com pena de “reclusão, de doze a trinta anos” (Código Penal, art.
121, §2º, inc. IV); e em “[p]rivar
alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado”
por “mais
de 1
5 (quinze)
dias”, com
pena “de reclusão, de dois a cinco anos” (Código
Penal, art. 148, § 1º, inc.
III).”

(trecho do voto da Ministra Cármen
Lúcia)

 

Assim,
os fatos descritos na peça acusatória encontram tipificação da legislação penal
pátria, o que foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal em diversas
oportunidades, não merecendo acolhimento a pretensão defensiva. Veja-se, a
propósito, o escólio, sobre o tema, de Enéas Romero de Vasconcelos, em bem
fundamentado artigo sobre a questão:

 

 “O seqüestro é
um crime contra a liberdade individual (bem jurídico protegido) e o sujeito
ativo do delito pode ser qualquer pessoa. O tipo exige, então, que o agente
prive outrem de sua liberdade dolosamente.16 (NUCCI, 2007; PRADO, 2010;
NORONHA, 2003; BRUNO, 1966; HUNGRIA, 1958)

O desaparecimento
forçado, por sua vez, possui um bem jurídico múltiplo (AMBOS, 2009) e exige
especial qualidade do agente e é sancionado com maior gravidade. O delito de
seqüestro torna passível de tipificação no direito interno, ainda que com menor
gravidade, as condutas, teoricamente, previstas como desaparecimento forçado” (in
“A investigação Penal dos Crime de Seqüestro, Homicídio e Ocultação de Cadáver
na Guerrilha do Araguaia” http://www.mpce.mp.br/esmp/publicacoes/edi002_2011/artigos/08)

 

14 – Atipicidade da conduta

Carlos
Alberto Augusto afirma que a conduta descrita na denúncia é atípica, pois o
documento de fls. 100/103 demonstra que a vítima encontrava-se asilado e
refugiado em Cuba na data de 12.10.1976, afastando a hipótese de sequestro.

A
questão envolvendo a informação constante do documento de fls. 100/103 já foi
suscitada pela defesa e apreciada à exaustão no item 9 supra.

Assim,
para evitar repetição de fundamentação, reitero os argumentos lançados anteriormente
para afastar a pretensão defensiva de atipicidade da conduta.

 

15 – Óbito da vítima

Invoca
a defesa de Carlos Alberto Augusto a Lei nº 9.140/95 para sustentar que foi
reconhecido, para todos os efeitos, a morte da vítima Edgar de Aquino Duarte.

Mais
uma vez cumpre reavivar o que já restou consignado por este Juízo na decisão de
recebimento da denúncia (fls. 1143/1149):

“Consigno, outrossim,
que a Lei n.º 9.140, de 04/12/1995, não serve de empeço para a presente ação
penal.

O diploma legal, de
caráter efetivamente humanitário, embora use em seu texto a expressão “para
todos os efeitos legais” reconhece a morte presumida (artigo 3º e 12 da
Lei n.º 9140/95) de pessoas desaparecidas em razão da participação, ou acusação
de participação, em atividades políticas no período de 02/09/1961 a 15/09/1979,
no âmbito civil, e não gera efeitos penais, em que se busca a verdade
real, o texto veio à lume em benefício dos familiares das vítimas e dos
próprios ofendidos, para que se facilitasse o pagamento a eles de indenizações,
não se admitindo que possa agora ser utilizado, como bem assentou o Ministério
Público Federal, para exonerar o Estado de seu dever irrenunciável de assegurar
proteção às vítimas, inclusive por meio do sistema processual criminal.

Se assim não fosse,
apenas para argumentar, os casos de desaparecidos forçados, o termo inicial da
prescrição da pretensão punitiva seria 05/12/1995 data da publicação da lei, e,
nesta hipótese, haveria a obrigação estatal de apurar crime de homicídio que
não estariam prescritos e nem acobertados pela anistia.

Acolho o entendimento
externado pelo E. Ministro Cezar Peluso, no julgamento da Extradição n.º 974,
lembrada pelo “Parquet” Federal, segundo o qual, em caso de desaparecimento de
pessoas seqüestradas por agentes estatais, somente uma sentença na qual esteja
fixada a data provável do óbito é apta a fazer cessar a permanência do crime de
seqüestro pois, sem ela, ‘o homicídio não passa de mera especulação, incapaz de
desencadear a fluência do prazo prescricional’.”

 

Ademais, não encontra a mínima plausibilidade
a alegação defensiva no sentido de que o voto do Ministro Cezar Peluso, na
Extradição nº 974, não se aplica ao presente caso.

Pelo contrário, o teor do referido voto,
afastando a ideia de morte presumida, enquadra-se perfeitamente no caso
presente, senão vejamos:

“De todo
modo, nem sequer entre nós se me afigura, data vénia, caso de
múltiplos homicídios, cuja materialidade resultaria de presunção jurídica das
mortes das vítimas.

É coisa
corriqueira que, nas hipóteses em que a infração deixe vestígios,
se mostra sempre indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto.
Cuida-se de prova exigida da lei, conforme vem logo do que dispõe o arí. 158
do Código de Processo Penal, combinado com a alínea ‘b’ do inc. Ill do art 564,
que fulmina de nulidade absoluta o processo, quando falte exame de corpo de
delito nos crimes que deixam vestígios,
salva a
hipótese prevista no art. 167, que se não ajusta ao caso.

É de
incontroversa doutrina:

‘Se deixar
vestígios a infração, a materialidade do delito e/ou a extensão de suas consequências
deverão ser objeto de prova pericial, a ser realizada diretamente sobre o
objeto material do crime, o corpo de delito, ou, não mais podendo sê-lo, pelo
desaparecimento inevitável do vestígio, de modo M,mo,

O exame
indireto será feito também por peritos, só que a partir de informações prestadas
por testemunhas ou pelo exame de documentos relativos aos fatos cuja
existência se quiser provar, quando, então, se exercerá e se obterá apenas um
conhecimento técnico por dedução’.

No  que 
concerne  à  prova 
de  materialidade  do 
homicídio, professa o insuperável HUNGRIA:

‘O homicídio é, tipicamente, um crime material: é
inconcebível sem que se verifique o evento morte de um homem. Como em geral nos crimes que
deixam vestígios, é base essencial da acusação, na espécie, o exame de corpo de delito, isto é,
a constatação da materialidade do crime. Nem mesmo a confissão do acusado,
sem outro elemento de convicção, supre a falta do owpMS detiai, pois o confitente pode
ter-se equivocado ou ser um mórbido auto-acusador, ou ter sido coagido a declarar-se autor do crime. O exame de corpo de
delito pode ser direto (mediante a inspeção ocular e autópsia do cadáver, para
averiguação da ousa rrurtis, meios que a produziram, etc.) ou indireto
(por meio de testemunhas, quando os vestígios do crime não possam ser pericialmente
verificados).

(…)

‘Somente
enquanto seja possível formular-se dúvida, ainda que mínima, em tomo à morte da
desaparecida vítima de uma violência, é que se deve afastar a possibilidade de
imputação do homicídio. Eloquente advertência em tal sentido foi um filme intitulado Fúria, exibido,
há alguns anos, nos cinemas brasileiros. O seu episódio central era um crime de multidão contra um
indivíduo suspeito de kidnapping e que fora recolhido a uma cadeia pública. Os
sediciosos atearam fogo à cadeia, que ficou reduzida a escombros. Entre estes não foi encontrado
o cadáver do prisioneiro, mas apenas um
anel reconhecido como de seu uso. Deduziu-se, então, que o corpo do desgraçado fora totalmente consumido pelo fogo e, embora não estivesse excluída a hipótese
de ter o prisioneiro conseguido
salvar-se fugindo, sem ser visto, por uma brecha que se abrira na parede de sua célula, os incendiários foram
processados, e estavam a pique de
ser condenados, quando, em plena sala de julgamento surgiu a pseudovídma: hipótese de ser fuga e salvamento,
até então rejeitada, era a única
verdadeira.”

A
indagação que, nessa moldura, se propõe é se tal prova, a do corpo de
delito, que no caso absolutamente não existe, pode suprida por presunção
legal de morte, à vista das disposições do Código Civil vigente, invocado
do ilustre Min. Relator.

Conquanto
apreciando o tema sob perspectiva análoga, que é a da
hipótese de extinção da punibilidade (art. 107, i, do Código Penal), diz-se,
não sem pertinência à espécie, sobre o estado atual da questão:

‘Quanto à
morte presumida (art. 6.° do Código Gvil), a doutrina divide-se: alguns sustentam
que, declarada a morte no campo civil, pode-se aproveitar tal decreto no
contexto criminal, extinguindo-se a punibilidade (Hungria, Noronha, Fragoso).
Outros, no entanto, seguem à risca o disposto no art. 62 do Código de Processo Penal,
aceitando somente a certidão de óbito para a extinção da punibilidade (Mirabete, Damásio). Parece-nos que a questão
deve ficar restrita à expedição ou não da certidão de óbito: se esta for expedida
em procedimento civil (art. 88, Lei 6.015/73), deve o juiz criminal aceitá-la para todos
os fins. Entretanto, se a certidão não for expedida, considerando-se a mortepreswrida somente
para efeito de
administração de herança ou qualquer outro fim, não há que se falar em extinção da
punibilidade. Aguarda-se, neste caso, a ocorrência da prescrição. É certo que a Lei
10.406/2002 (atual Código Civil) acrescentou outras hipóteses de declaração
de morte presumida, como ocorre no art. 7.° (“Pode ser declarada a morte presumida, sem
decretação de ausência: I – se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida; II – se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for
encontrado até 2 (dois) anos após o término da guerra. Parágrafo único. A declaração da morte
presumida, nesses casos, somente poderá ser requerida depois de esgotadas
as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do
falecimento”). Nesses casos, diversamente da ausência, em que se presume a morte somente pelo fato de alguém desaparecer por
certo tempo de seu domicílio, sem deixar notícia ou paradeiro, busca o juiz cível – como se
faz, aliás, na Vara dos Registros Públicos em caso de morte trágica – o paradeiro de pessoas que estavam em perigo de vida,
cuja morte é extremamente provável ou quando desapareceram em campanha ou foram feitas
prisioneiras, sem que fossem
encontradas até 2 anos após a guerra, fixando a sentença a provável data do
falecimento. Parece-nos, pois, que, registrada a decisão, pode-se dar o mesmo efeito da
certidão de óbito, declarando-se extinta a punibilidade.’

Como,
aliás, se vê e deflui nítido do teor literal do art. 7º do Código Civil em vigor, para que
exsurja considerável presunção legal de morte, não basta o mero juízo de
extrema probabilidade da morte de quem estava em perigo de vida (inc. I), havendo mister a existência de sentença que, depois de esgotadas as buscas e averiguações, produzidas em
procedimento de justificação
judicial, fixe a data provável do falecimento (§ único).

Ora, não
há, ao propósito das hipotéticas mortes das vítimas dos sequestros – que se não resumem
às onze pessoas nominadas no sumário do processo
(fls. 06 e verso e 55-56), e cuja média de idade, à época do desaparecimento, eram de pouco mais de vinte anos
(cf. fls. 27 verso-44 verso e 95-121), o que afasta certa probabilidade de
morte natural -, nenhuma sentença, seja
de declaração de ausência, seja de declaração de morte presumida, de modo
que, ainda quando, ad argumenfandum tantum, se pudera, em simples conjectura, cogitar de circunstâncias
desconhecidas nestes autos, que, aliadas ao só decurso do tempo, induzisssem
alguma probabilidade de falecimento, faltariam, para caracterização de
corpo de delito tndireto, os requisitos exigidos pelo próprio art. de nosso Código Civil. Noutras palavras, essa
norma não incide na espécie, simplesmente porque se lhe não reuniram os
elementos de seu suporte fático (fattispecie
concreta), donde a ideia de homicídios não passar, ainda no plano jurídico, de mera especulação,
incapaz de desencadear fluência do
prazo prescricional.

E incapaz de o desencadear
ainda por outro motivo de não menor peso. É
que, à falta da sentença que, como predica o art. 7º, § único, do Código
Civil, deve fixar a data provável do falecimento, bem como na carência absoluta
de qualquer outro dado ou prova a respeito, não se saberia quando entraram a correr os prazos de prescrição da pretensão
punitiva de cada uma das mortes
imaginadas ou de todas, que poderiam dar-se, como sói acontecer, em datas diversas, salva cerebrina hipótese de
execução coletiva! E, tirante o que
nasce de fabulações, de modo algum se poderia sustentar, com razoável pretensão de consistência, hajam falecido todas
as pessoas que, segundo a denúncia, teriam sido sequestradas, e, muito menos,
assentar-lhes as datas prováveis de
cada óbito.

E tudo
isso, que não é pouco, sem levar em conta o obstáculo intransponível
de que, como o impõe a lei, não está nem poderia estar descrito o comportamento
circunstanciado do extraditando em cada ação de matar! Como conceber-se, sem
acusação com todas as suas formalidades legais, a prática de vários
homicídios, ignorando-se em que teriam consistido as ações históricas em que se
traduziriam os chamados meios executivos de cada delito? Teriam sido cometidos
por ação ou omissão, de maneira direta ou indireta? Onde e quando?

Como se
percebe, não há nenhum suporte para a ideia de configuração
de homicídios, que, se lhes houvesse vestígios, decerto não teriam escapado à
investigação e à estima das autoridades do Estado requerente.”

 

Portanto, a Lei nº 9.140/95, por si só, não
constitui meio suficiente para comprovar a morte da vítima e, assim, não afasta
a configuração do seqüestro.

Desse
modo, é improcedente a tese defensiva.

16 – OBEDIÊNCIA HIERÁRQUICA

O
réu CARLOS ALBERTO AUGUSTO afiançou que teria agido de acordo com a
determinação de seus superiores hierárquicos, não lhe sendo exigível conduta
diversa na ocasião e, portanto, não se consubstanciando o delito em tela (art.
22 do Código Penal).

A
tese evidentemente não prospera.

O
réu participou de forma consciente dos atos executivos, segundo se depreende da
análise dos autos, não havendo razão para excluir sua culpabilidade, uma vez
que o art. 148, § 2º do Código Penal estava em vigência e a ordem de superior
hierárquico jamais poderia ser considerada não manifestamente ilegal, estando
ausente a o requisito de legalidade aparente da ordem (art. 18 do antigo Código
Penal, atual art. 22 do diploma legal).

II
– Repise-se, em remate, que, nesta fase processual, vigora o princípio “in
dubio pro societate”, e, diante da acusação formalizada pelo Ministério Público
Federal, presentes os requisitos formais e os pressupostos processuais e
condições da ação, inclusive a justa causa, vale dizer, em exame liminar e não
exauriente se os fatos imputados aos réus encontram eco nos elementos de
convicção coletados – como se afigura o caso dos autos – não cabe ao magistrado
coarctar  o direito do órgão ministerial
de provar a contento todo o alegado, sob pena de cerceamento da acusação.

Diante
de todo o exposto, indefiro os
pedidos de absolvição sumária formulados pelas defesas, por ausência de
qualquer das causas estabelecidas no art. 397 do Código de Processo Penal.

Determino, por conseguinte,
o prosseguimento da ação penal. 

Designo
o dia 09 de dezembro de 2013, às 14:00
horas
, para a realização da audiência de inquirição das testemunhas de
acusação José Damião de Lima Trindade, Artur Machado Scavone e Pedro Rocha
Filho.

Designo
o dia 10 de dezembro de 2013, às 14:00
horas
, para a realização da audiência de inquirição das testemunhas de
acusação Ivan Akselrud Seixas, Lenira Machado e César Augusto Teles.

Designo
o dia 11 de dezembro de 2013, às 14:00
horas
, para a realização da audiência de inquirição das testemunhas de
acusação Maria Amélia de Almeida Teles e Virgílio Egydio Lopes Enei.

Deverá
o Ministério Público Federal manifestar-se sobre a necessidade de intimação das
testemunhas arroladas, uma vez que não há indicação de endereço no rol de fls.
1142.

Intimem-se
os réus para comparecimento às audiências.

Posteriormente,
será designada audiência para oitiva das testemunhas arroladas pelos réus.

Sem
prejuízo, deverão as defesas manifestar-se, no prazo de 05 (cinco) dias, quanto
à necessidade de intimação das testemunhas arroladas.

A
defesa de Carlos Alberto Augusto deverá, ademais, declinar especificamente o
endereço de cada uma das testemunhas arroladas, uma vez que a indicação
genérica dos endereços constante do rol de fls. 1804, não permite o correto
envio de intimações ou mesmo ofícios àqueles que possuem prerrogativas
especiais para depoimento em Juízo.

A
defesa comum de Carlos Alberto Brilhante Ustra e Alcides Singillo formulou
pedido de expedição de ofício à Comissão de Anistia Política do Ministério da
Justiça para o fim de solicitar o envio de cópia do processo administrativo que
autorizou o pagamento de indenização aos familiares de Edgar de Aquino Duarte.

Contudo,
a defesa não especifica a necessidade de produção de referida diligência,
tampouco sua finalidade. Ademais, não demonstrou ter tentado obter diretamente
a cópia pretende, preferindo transferir o ônus ao Juízo.

Diante
desse quadro, indefiro o pedido de
expedição de ofício à Comissão de Anistia, por não estar demonstrada a
necessidade de intervenção judicial.

Além
disso, conforme já afirmado por este Juízo na presente decisão, o disposto na
Lei nº 9.140/95 não tem o efeito de caracterizar a morte da vítima e, por
consequência, afastar a imputação de seqüestro.

Intime-se
o Ministério Público Federal da decisão de fls. 1891.

Junte-se
aos autos a certidão de óbito de Edsel Magnotti, dando-se vista ao órgão
ministerial para manifestação, que também deverá se manifestar sobre a certidão
de óbito de Luiz Gonzaga Santos Barboza, juntada às fls. 1214.

Intimem-se.

São Paulo, 2 de outubro de 2013.

 

 

HÉLIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA

JUIZ FEDERAL

[1] § 3o A
decisão terá eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais
órgãos do Poder Público.
[2] Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/index.php/decisions-and-judgments.
Acessado em 20.09.2013.
[3] “é
desnecessária a prova completa e taxativa da ocorrência do crime e de seu
autor, bastando a fundada suspeita de autoria e prova da materialidade dos
fatos
” (TJSP – RT 671/312),
[4] Direito Penal do inimigo: noções e
críticas. Gunther Jakobs, Manuel Cancio Meliá; org. E trad. André Luís
Callegari, NEreu José Giancomolli. 4ª ed. Atual. E ampl. – Porto Alegre:
Livraria do Advogado Editora, 2009, p. 31 e 36
[5] Direito Penal do inimigo: noções e
críticas. (…) p., 90 e 101.
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