….A liberdade de expressão dos juízes….

Cerceamento da liberdade de expressão do juiz nada mais é do que uma forma oblíqua de controle ideológico

Aconteceu no Rio de Janeiro, mas podia ter acontecido em São Luís, Brasília ou São Paulo.

Aconteceu com o Rubens, mas podia ter acontecido com qualquer juiz.

O alerta deve servir a todos: é preciso preservar a liberdade de expressão dos juízes e repelir a tentativa de tutela ideológica.

Após uma entrevista do juiz Rubens Casara concedida à revista Carta Capital, em que tecia críticas à invasão policial no Morro do Alemão, o Ministério Público arguiu sua suspeição para julgar processos cujas condutas tivessem sido ali praticadas.

A exceção de suspeição não se devia ao fato de ter o juiz manifestado previamente sua opinião diante de um processo que estava para seu julgamento, mas por ter se manifestado politicamente e de forma genérica sobre a operação policial.

Que as operações policiais devem cumprir a lei, supõe-se que nem juízes nem promotores possam discordar. Mas manifestação de juiz, que não se refere às partes envolvidas em julgamento, não pode ser cerceada –a tentativa de calar o juiz em sua dimensão de cidadão equivale à mordaça, contra a qual, por muito menos, os próprios membros do Ministério Público se bateram.

As tentativas de manter o juiz isolado da sociedade, supostamente para deixa-lo isento de paixões para a objetividade de seu julgamento, sempre foram frustradas. É conhecida a imagem metafórica da Torre de Marfim, dentro da qual escondia-se o magistrado, alheando-se de seus pares.

De tanto se entender diferente e alheio à uma sociedade da qual faz parte, acabam os juízes não sendo mais reconhecidos por ela.

Ao revés, o juiz faz parte da sociedade, tem ideias e tem paixões, move-se por seus pensamentos e sentimentos, e nenhum julgamento, como de resto qualquer outra atividade humana, pode ser despida da forma pela qual entende o mundo.

A extrema objetividade da lei, o postulado de “neutralidade” do juiz, nada mais são do que vestígios da positivismo, que buscou encarcerar o direito no legalismo e, sobretudo, excluir da lei justamente os conflitos de que ela é resultante.

O juiz também é um cidadão, também pensa e também tem o direito de se expressar. A sociedade não deve ter medo do que o juiz possa dizer publicamente, mas sim do que ele pode fazer às escondidas.

O cerceamento da liberdade de expressão do juiz nada mais é do que uma forma oblíqua de controle ideológico e, por consequência, de supressão de sua independência.
Deixar o juiz refém, no entanto, não é ruim para ele, mas para toda a sociedade.

Leia também: Juízes defendem direito de expressar suas opiniões(da Consultor Jurídico)

2 Comentários sobre ….A liberdade de expressão dos juízes….

  1. J.L.Tejo 17 de março de 2011 - 15:48 #

    Sem entrar no mérito da questão -a invasão homicida às comunidades do Alemão e Vila Cruzeiro- eu tenho muitas reservas quanto a manifestações de opinião por parte de juízes.

    É evidente que qualquer cidadão -o juiz inclusive- tem o direito de expor seu pensamento livremente, como convém a um Estado democrático de Direito. Contudo, o "munus" judicial deve ser observado, em prol da (em tese) imparcialidade do cargo.

    Por exemplo, queixava-se muito, e com razão, da postura de Gilmar Mendes, quando de sua presidência no STF. Chamar constantemente os holofotes para si, como fazia Gilmar, apenas serve pra crivar de suspeita a atividade do Judiciário.

    Parece-me então que a questão deve ser bem ponderada. Nem cercear os juízes enquanto cidadãos (e portanto portadores de opinião), nem fazer da Magistratura tribuna para defender teses, que é função da Advocacia e do Ministério Público.

  2. Anônimo 23 de março de 2011 - 03:13 #

    Lúcido, como sempre, Marcelo.
    Tomei a liberdade de indicar a leitura na lista de discussão dos colegas aqui do TRT/18ª Região.
    Grande abraço,
    Pimenta