Se a trave salvou o time de um vexame, a imprensa não teve a mesma sorte
Pode até ser que a seleção brasileira não esteja lá muito bem das pernas –o sufoco na classificação por pênaltis contra o Chile acendeu a luz amarela. Mas é fato de que nesta Copa, a imprensa e a torcida estão ainda piores que ela.
Se é verdade, como diz a manchete da Folha de S. Paulo de domingo, que a trave salvou o time de um vexame, a mídia não vem tendo a mesma sorte.
O blogueiro de Veja foi ridicularizado na imprensa estrangeira por sugerir uma teoria da conspiração com o emblema da Copa, onde números em vermelho estariam fazendo uma subliminar propaganda do governo. Um dos colunistas mais respeitáveis da imprensa escrita, que escreve para os dois maiores diários do país, se notabilizou por fazer uma entrevista com o sósia do Felipão, supondo ser o treinador.
Mas nada se equipara à derrocada do catastrofismo, que pautou a grande mídia nos meses que antecederam ao início da competição. Os estádios não ficariam prontos, os aeroportos não dariam conta da demanda, a mobilidade e a segurança estavam seriamente ameaçadas, tudo convergindo para uma vergonha nacional.
Não foram poucos os que replicaram a toada e que sentenciavam o fiasco do evento –no que foi certamente a previsão mais equivocada que o jornalismo brasileiro já fez, contando todos os furos da meteorologia.
O medo se espalhou por muitos, a demora na empolgação fez parecer que a torcida também se contaminara desse pessimismo calculado. Quando a Copa começou, se iniciaram os arrependimentos de quem se deixou levar pelo fim de mundo proclamado e perdeu chances de aproveitar os jogos ou a festa.
Outro dia, na própria Folha de S. Paulo, o colunista Luiz Caversan se perguntava quem pagaria o prejuízo dos comerciantes que, aderindo ao pessimismo, deixaram de se preparar para os lucros? Não se espere daí um mea culpa. A mídia local cuidou logo de transferir o erro para a “imprensa estrangeira”, que dias depois de começado o evento, já não reconhecia o “Copa das Copas” como um slogan assim tão ufanista.
Contaminada também pelo momento eleitoral, parte da torcida demorou demais a se engajar no ânimo da Copa –muitos com o pensamento equivocado de que algum candidato poderia ter ganho eleitoral com a vitória ou a derrota da seleção.
O país já passou por várias Copas e seus eleitores já mostraram o quão pouco a classificação influencia o pleito. Mas por incrível que pareça, o assunto é frequente nas rodas mais VIPS do país, aquelas mesmas que se arrogam em ter o “fundamento do pensar” e desfilam pessimismo mais como plataforma do que estado de espírito.
Pior ainda foram os episódios grotescos que a torcida tem proporcionado nos estádios, como o de xingar a presidenta ou vaiar o hino do adversário.
O desrespeito nada tem a ver com a precária educação pública -86% da torcidabrazuca nos campos tem ensino superior completo. É apenas caso de arrogância, de quem olha para o seu selfie como o retrato do país. Felizmente não é.
Torço para que o Brasil reencontre o futebol, que parece ter sido sequestrado de seu próprio passado pela Colômbia, e os jogadores tenham força para resistir à sufocante pressão que um favoritismo sem base real colocou em suas costas. Afinal diante de uma torcida imensa para que o campeonato nem sequer acontecesse, ou que fosse um verdadeiro fiasco, jogar em casa não é uma grande vantagem.
Realizar bem o mundial, mesmo que seja o melhor de todos os tempos, não significa esquecer os demais problemas que circulam em seu entorno, como o enorme déficit de moradia e a permanência da violência policial, só para citar aqueles com os quais nos deparamos todos os dias, com ou sem jogos.
Mas com esses problemas nem a grande imprensa nem a torcida instagram parecem estar lá muito preocupados.
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