….uma visita incômoda….

Com prêmio Nobel da Paz ou não, Obama não deixou o Afeganistão e continua mantendo prisões antigas sem processo em Guantânamo

A visita de um presidente a outro país carrega mais uma força simbólica do que propriamente objetivos estratégicos. Em muitos casos, todavia, acordos significativos podem ser firmados.

Obama não saiu do Brasil com um grande pacote de negócios fechados e não deixou por aqui a melhor das imagens.

Já que nada relevante veio à luz com o passeio da família imperial, fica a pergunta: o que Obama, afinal, veio fazer no país?

Se o simbolismo era sua única pretensão, pode-se dizer que o bombardeio saiu pela culatra. O comício marcado para a Cinelândia foi cancelado pelos próprios organizadores. Obama deve ter descoberto que os brasileiros não estavam assim tão interessados em ouvir um grande líder mundial.

Fato é que a onda de antiamericanismo que varreu o planeta nos anos de chumbo da era Bush ainda não se dispersou, a despeito do carisma, da elegância e das promessas de mudanças de Obama.

Talvez seja porque na política externa essas promessas ainda não tenham se feito notar.

Não há quem esteja tratando Obama hoje, de forma muito diferente da que tratou outros presidentes norte-americanos ao longo da história. Pelo menos não com o ineditismo que ele nos supôs acreditar com os seguidos “yes,we can” da campanha.

Afinal, com prêmio Nobel da Paz ou não, o país não deixou o Afeganistão e continua mantendo prisões antigas sem processo em Guantânamo, depois de cumprida metade de sua gestão.

A marca da visita de Obama não foi a do estadista mundial que fala com o povo, mas o enorme aparato de segurança que o separa dele.

Desta vez, constrangeu até mesmo ministros de estado revistados em Brasília, como se a obrigação de nosso antigo chanceler em tirar sapatos ao entrar nos Estados Unidos, na era Bush, não tivesse sido humilhante o suficiente.

Ao invés de receber demonstrações de carinho, a visita do presidente norte-americano gerou protestos e prisões, como, aliás, já tem se tornado rotineiro em outros países.

Obama fez um agrado simbólico a Dilma ao lembrar da importância de sua luta contra a ditadura no Brasil. Mas esteve longe de reconhecer, em um mea culpa, a participação e o apoio dos Estados Unidos do outro lado do balcão, fatos sobejamente conhecidos, muito antes da tempestade Wikileaks.

Os problemas fundamentais do contencioso comercial entre os países não foram solucionados.

O presidente não está disposto a reduzir barreiras e nós continuaremos a conversar por intermédio de organismos internacionais, a despeito da profunda amizade entre os povos e países, apregoados nos seguidos discursos.

Por fim, não disse nem sim nem não ao pleito do Brasil por uma cadeira no Conselho de Segurança. Apenas, de uma forma oblíqua, que tem por ele apreço, o que pode significar tudo, ou absolutamente nada.

Mas justamente em terra brasileira, deu início a mais uma guerra, coisa que definitivamente nosso país não tem tradição nem apreço. O constrangimento foi tal que só após a saída de Obama, o Brasil se animou a pedir o cessar-fogo das operações na Líbia.

Há quem veja, em ambas as situações, a busca desenfreada pelo petróleo, nas bombas em Tripoli ou na cortesia à senhora do pré-sal. Considerando que centenas de milhares de pessoas morreram em guerras étnicas da África, sem qualquer intervenção militar (como Ruanda e Sudão), a hipótese não pode ser simplesmente descartada.

Obama e família, enfim, cumpriram o seu papel de visitantes colonizadores. Foram a favelas, assistiram aulas de capoeira e de percussão, conheceram uma escola de samba. Nós cumprimos o nosso – o presidente ruim de bola saiu-se com camisas dos mais variados times de futebol do Rio de Janeiro.

Para o fim de uma viagem absolutamente opaca, a primeira família encerrou com visita noturna a um Cristo Redentor deserto e sem a visão resplandecente que fez da Baía da Guanabara um informal patrimônio da humanidade.

Tanto ele como nós podíamos ter ficado sem essa.

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2 Comentários sobre ….uma visita incômoda….

  1. Cirilo Vargas 24 de março de 2011 - 08:04 #

    A visita do Obama, afinal, não serviu para absolutamente nada. Teve mero valor simbólico para manter as velhas relações. Que nada mudaram na atual administração americana.

  2. Anônimo 24 de março de 2011 - 19:33 #

    Como se diz aqui no interior: carro de boi quando faz muito barulho é porque está vazio. (Sidney)