….área vip: privilégio para mim, ética para você…

A imprensa que se indigna com os privilégios é a mesma que incensa a área VIP

Não sou um admirador ferrenho do rock, mas embalado pela companhia estimulante dos amigos das redes sociais, acabei acompanhando os embalos de sábado à noite no sofá, assistindo ao Rock in Rio pela televisão dias seguidos.

Entre uma música e outra, e muitas tuitadas, pude acompanhar o incansável espetáculo das prestigiadas entrevistas da área VIP, mantida pela organização do evento.

As apresentadoras da TV incensavam o lugar: vamos pra lá que tem ar condicionado e canapés para todos.

Todos, no caso, é uma coleção de artistas e apresentadores da própria televisão que transmitia o evento –e sabe-se lá quantas autoridades.

Tudo bem, ao final, muitos comentaram o “dia de rock, bebê”, da Cristiane Torloni, ou a expansiva entrevista de Willian Bonner, a quem nos acostumamos a ver taciturno no Jornal Nacional.

Mas o desfile de subcelebridades que tinham pouco a dizer sobre o evento (além de explicar como deixaram seus filhos em casa num dia e o trouxeram em outro) marcou a transmissão com um quê de revista Caras –aquela que leva seus ricos e famosos para ilhas e castelos.

Afinal de contas, a exclusividade é tudo.

Para quem tanto incensa a área VIP, as pessoas “realmente importantes”, ou, no caso a si mesma, quando se dirige aos próprios atores, fica estranho o discurso moralista que se verá nas edições dos telejornais dos dias seguintes: o respeito à ética e aos postulados republicanos, a indignação com os privilégios, o apelo ao fim do patrimonialismo.

As relações de privilégios (leis privadas, em sua concepção etimológica, que servem a poucos) são altamente nocivas na esfera pública, rompendo a noção de igualdade que a lei deve assegurar.

Mas não nos enganemos: elas só existem no espaço público, porque são assim tão prestigiadas no privado.

A ânsia de levar vantagem, de ter exclusividade, de se diferenciar dos demais está na raiz dos privilégios que o poder distribui –com regras, cargos e verbas selecionadas a dedo a pessoas que sejam “realmente importantes”.

A corrupção é mais filha da desigualdade do que nossa vã filosofia faz supor.

Ou, como diria, Antoine de Saint-Exupéry: Você se torna responsável por tudo aquilo que cativas…

3 Comentários sobre ….área vip: privilégio para mim, ética para você…

  1. Bruno 4 de outubro de 2011 - 17:31 #

    Ótimo comentário. Chamo atenção que esses VIP's chegaram a reclamar de 'superlotação' da área em alguns dias…
    Outro exemplo grandioso dessa postura torta é o 'nepotismo' que alguns figurões de TV insistem em patrocinar: diretores de novela escalam suas mulheres, filhas e filhos sem qualquer constrangimento. Esquecem que o serviço de comunicações é uma concessão pública.

  2. Isac 30 de outubro de 2011 - 19:28 #

    Gostei muito de seu artigo. Afinal há tempos venho observando como alguns (muitos) brasileiros gostam de ter privilégios. E que os membros "dessa turma", por outro lado, acabam também demonstrando outros comportamentos nocivos à vida em sociedade. São pessoas que não gostam das filas, e não costumam respeitá-las. Também ignoram vagas de estacionamento para idosos ou deficientes. Nas estradas querem sempre ultrapassar a todos, seja ou não em lugares proibidos ou perigosos. Enfim gostam de, em muitas situações, levar vantagem em tudo, como dizia a antiga Lei de Gerson. Assim acabo desconfiando de que há uma grande proximidade entre ter privilégios e estar acima do resto da sociedade (e de suas leis, também).

  3. Vânia Paim 14 de novembro de 2011 - 05:25 #

    No Brasil ainda não conseguimos nos livrar dos privilégios. O "sabe com quem está falando" continua em moda… A lei, os benefícios não são para todos. A verdade é que as pessoasacham normal.