….Juízes para a Democracia propôs extinção da Justiça Militar na Reforma do Judiciário….

Justiça Militar quer
conciliar o inconciliável: hierarquia e igualdade

 
 
Jornal Juízes para a Democracia 17 (1999)
 
 

O tema
voltou à baila com a proposta de conselheiros no CNJ de discutir a extinção da
Justiça Militar nos Estados (leia aqui).
 
Há pelo
menos 20 anos, todavia, a Associação Juízes para a Democracia se bate
pela extinção da Justiça Militar, não apenas para redimensionar a Justiça (com
número ínfimo de julgamentos, em contraste com outros órgãos), como também para
abolir foros privilegiados e evitar desigualdade. Não apenas pelo pouco
movimento de ambas Justiças Militares, estaduais e federal, mas também para que
especialmente as polícias militares (afetas à Justiça Militar estadual) deixem de ser órgãos
reprodutores de violência.
 
O texto
abaixo  foi apresentado aos membros da Comissão de Reforma do Judiciário, na
Câmara dos Deputados, em 27/04/99 (a primeira manifestação neste sentido data,
entretanto, de 1993, reproduzida no Número Especial de Lançamento da Revista
Justiça e Democracia)
 
 
 
Extinção da Justiça
Militar
A Associação Juízes para a Democracia reitera a sua proposta de
extinção da Justiça Militar, que já fora tema de manifestação da associação em
1993.
 
O foro privilegiado é herança de um regime
inaceitável, banido pela sociedade brasileira e, como conseqüência lógica, a
Justiça castrense não deve subsistir.
 
É flagrante a incompatibilidade entre o Estado
Democrático de Direito e a existência da Justiça Militar como um dos órgãos do
Poder Judiciário, na medida em que fere o princípio da igualdade e estabelece
tratamento privilegiado para um grupo de pessoas, tão somente por exercerem a
profissão militar.
 
A alegação de que a instituição da Justiça Militar
não visa a pessoa do militar, mas sim a função peculiar que ele exerce, é de
todo desarrazoada.
 
Se assim fosse, poderia se imaginar que justo seria
que os crimes cometidos por jornalistas, médicos, metalúrgicos, etc. fossem
julgados pela Justiça do Jornalistas, pela Justiça dos Médicos, pela Justiça
dos Metalúrgicos, e assim por diante, tendo em vista as particularidades de
cada uma destas profissões.
O julgamento dos militares, na forma estabelecida,
nada mais representa do que um exercício corporativista, já que inexigível que
o membro de uma corporação consiga perceber a realidade, em suas múltiplas
facetas, pois não pode apagar de sua inteligência e de sua emoção todos os
vínculos que possui em relação a essa corporação. O julgamento dos militares
por seus pares compromete a imparcialidade da decisão, sendo que esta é caráter
essencial da jurisdição.
 
A Justiça supõe o julgamento de iguais por iguais
e, como salientou Dyrceu Aguiar Dias Cintra Júnior in “Judiciário e Reforma”,
publicado no “O Estado de S. Paulo”de 12.11.1994, as Justiças Militares “pretendem
conciliar conceitos inconciliáveis: o ideal de Justiça – baseado na igualdade e
democracia— e a hierarquia militar — que por definição só pode se basear na
antidemocracia da diferença entre o que manda e o que obedece —, de cujo topo
sai parte dos juízes
”.
 
Os dados fornecidos pela Procuradoria Geral da
Justiça de São Paulo, informam que em 1995 foram julgados pela Justiça Militar
205 casos de homicídio e apenas 23% resultaram em condenações. Em 1997, nos
processos em que os réus eram PMs, julgados pela Justiça Comum, 48% resultaram
em condenações.
 
Os números confirmam a existência de espírito
corporativo na Justiça Militar.
 
A sujeição do julgamento de delitos à Justiça Comum
pode contribuir para a formação de uma nova polícia, que consiga ser um
elemento de paz, que tenha bases novas e não seja órgão reprodutor de
violência, como estamos presenciando atualmente. Reina o sentimento de
impunidade face à banalização da violência exercida pelos militares.
 
A Justiça, na forma posta, chancela a impunidade e
estimula a violência, como se pode ver de fatos recentes de nossa história, por
todo o País, sendo certo que a manutenção do beneplácito do foro especial só
tende a multiplicar tal situação.
 
A estrutura da instituição castrense, fundamentada
na hierarquia e disciplina, em nada seria prejudicada com a extinção da Justiça
Militar, já que as faltas administrativas serão apuradas no âmbito interno da
corporação e, neste campo, o conhecimento da profissão militar possibilita a
melhor apreciação dos fatos.
 
Porém, as faltas que caracterizam delito devem ser
julgadas com imparcialidade, de forma que os aspectos administrativos — de
natureza disciplinar — não se sobreponham às questões judiciais. Deve-se
garantir ao faltoso a igualdade e o julgamento por juiz imparcial.
 
Com isto resguarda-se os direitos e garantias
individuais.
 
Há que se destacar, o aspecto econômico da medida,
já que o orçamento para 1999 para a Justiça Militar, conforme publicação de “O
Estado de S. Paulo”
, caderno A-14, de 11.4.99 (fonte: Comissão Mista de
Orçamento do Congresso Nacional) é de R$ 94.380.300,00, valor que se aproxima
do orçamento do Supremo Tribunal Federal, que para o mesmo ano é de R$
112.207.101,00.
 
No ano de 1997, o Superior Tribunal Militar, com
quinze ministros, julgou 464 (quatrocentos e sessenta e quatro) processos e
todas as auditorias da Justiça Militar Federal, no mesmo ano, julgaram 485
(quatrocentos e oitenta e cinco) processos, conforme Banco Nacional de Dados do
Poder Judiciário.
 
Os números ínfimos também aparecem na Justiça
Militar Estadual. Em 1997, foram julgados em todo o Brasil 5.888 processos. Na
Bahia foram julgados 36 processos, em Santa Catarina 50; em Minas Gerais (com
três auditorias) 212 ; no Espírito Santo 84; no Rio de Janeiro 65; em São Paulo
3.417 (com cinco auditorias).
 
Com a extinção proposta, a Justiça seria redimensionada, os privilégios
findariam e as garantias constitucionais seriam resguardadas.
 

 

Texto de Proposta na Revista Justiça e Democracia (1995)
 
 
 
 
 
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