….não passarão, por Rubens Casara….

Um espaço de diálogo e resistência ao fascismo que cresce na sociedade brasileira

O texto que segue é o da abertura do Blog Não Passarão, recentemente inaugurado pelo juiz e professor carioca Rubens Casara, que indico para acompanhamento aos leitores do Sem Juízo.

O texto, como o próprio Blog, pretende servir de espaço de diálogo e resistência ao processo de fascitização da sociedade brasileira, visível em vários momentos, corajosamente apontados pelo autor: Mulheres que dão a luz algemadas, toque de recolher em comunidades pobres, a gestão da miséria através do Exército, a prisão de lideranças dos movimentos sociais, os episódios de violência policial contra estudantes, as agressões a dependentes químicos, a arapongagem em universidades públicas, o aumento no número de Autos de Resistência, o encarceramento em massa da população pobre, a desqualificação dos defensores dos direitos humanos, os movimentos legislativos que defendem o recrudescimento do sistema penal, dentre outros fenômenos que se tornaram cotidianos.

Não passarão, Rubens Casara*

Este blog se inspira no grito antifascista “não passarão!” («¡No pasarán!») e pretende servir como um espaço de diálogo e resistência ao processo de fascistização da sociedade brasileira. Na atual quadra histórica, em que é possível identificar várias características do fascismo clássico na sociedade brasileira (parece evidente que existem fascismos para além do fenômeno italiano), vale lembrar das palavras eternizadas por Dolores Ibárruri Gómez (La Pasionaria), durante a Guerra Civil Espanhola, com o objetivo de expressar a determinação de defender uma posição contra o inimigo que se aproximava.

O lema antifascista também foi utilizado na Revolução Sandinista na qual ruas foram bloqueadas pela população em defesa dos revolucionários, e, desde então, ressurge sempre que um movimento autoritário apareça como ameaça.

Hoje, mostra-se cada vez mais crível a hipótese de que as crises do capitalismo fazem nascer movimentos fascistas. Na linha desenvolvida tanto por Leandro Konder (KONDER, Leandro. Introdução ao fascismo. São Paulo: Expressão Popular, 2009, p. 53) quanto por Robert Owen Paxton (PAXTON, Robert. A anatomia do fascismo. Trad. Patrícia e Paula Zimbres. São Paulo: Paz e Terra, 2007, p. 43) pode-se afirmar que as forças capitalistas, incapazes de assegurar a expansão contínua dos mercados, o amplo acesso à matéria-prima e à mão barata (e obediente), o controle sobre as populações indesejadas (leia-se: daqueles que não interessam à sociedade de consumo) e os movimentos reivindicatórios por meio de operações adequadas ao modelo democrático, viram-se obrigadas a encontrar novas maneiras de alcançar esses objetivos pela força, ou seja, o projeto capitalista, não raro, tem que assumir a forma de um movimento fascista.

No fascismo, o Estado apresenta-se como superior a todos os indivíduos. Estes, portanto, ficam subordinados às razões estatais e a um poder praticamente sem limites. Há uma tentativa de edificação de um Estado total, isto é, um Estado que se sobreponha ao indivíduo a ponto de anulá-lo. Não por acaso, a intolerância torna-se uma constante, o que leva à repressão da diferença. Nega-se, portanto, a alteridade e acentua-se a criação e a preocupação com os inimigos do Estado, com aqueles que criticam ou não acatam as razões do Estado. Note-se que as tentativas de solucionar os problemas de saúde pública (como as questões das drogas etiquetadas de ilícitas e do aborto) e de controlar reivindicações populares (basta pensar no fenômeno da criminalização dos movimentos sociais) através do sistema penal são manifestações desse Estatismo que se vinculam ao ideário fascista.

Outra característica marcante é o fato do fascismo se apresentar como um fenômeno racional ou mesmo natural. O fascismo e as práticas fascistas aparecem para os seus adeptos como conseqüências necessárias do Estado, dessa relação entre homens que dominam outros homens através do recurso à violência que se apresenta como legítima. Assim, como toda forma de ideologia, o fascismo não é percebido como tal por seus agentes: tem-se, então, a naturalização de práticas fascistas, mesmo em ambientes formalmente democráticos.

Também é reconhecida como característica dos movimentos fascistas o seu pronunciado ativismo, com o recurso à força como meio preferencial à solução dos diversos problemas sociais. Por evidente, os freqüentes excessos gerados por esse ativismo passam a exigir uma ampla cumplicidade entre os membros do establishment: magistrados, promotores de justiça, policiais, militares, jornalistas, homens de negócio e etc.

Os vários fascismos também sempre tiveram a necessidade de um inimigo demonizado contra o qual utilizar a força, ou melhor, em razão do qual a utilização da força estaria legitimada. Esse inimigo é o “estranho”. Na pós-modernidade, o estranho a ser demonizado (e, portanto, objeto em potencial do sistema penal e das práticas fascistas) é aquele que não está inserido funcionalmente na sociedade de consumo ou que se opõe ao status quo.

Hoje, vivenciam-se os efeitos de mais uma crise do capitalismo e, no Brasil, acentua-se um novo processo de fascistização da sociedade. Mulheres que dão a luz algemadas, toque de recolher em comunidades pobres, a gestão da miséria através do Exército, a prisão de lideranças dos movimentos sociais, os episódios de violência policial contra estudantes, as agressões a dependentes químicos, a arapongagem em universidades públicas, o aumento no número de Autos de Resistência (a polícia brasileira é a mais letal do mundo: a que mais mata e a que mais morre), o encarceramento em massa da população pobre, a desqualificação dos defensores dos direitos humanos, os movimentos legislativos que defendem o recrudescimento do sistema penal, dentre outros fenômenos que se tornaram cotidianos, são sintomas de que o fascismo se faz presente.

Diante desse quadro, o lema é: não passarão! Conto com a colaboração de todos neste espaço

*Rubens Casara é Doutor e Mestre em Direito, Juiz de Direito do TJ/RJ, Professor Universitário, Membro da Associação Juízes para a Democracia (AJD), do Movimento da Magistratura Fluminense pela Democracia (MMFD), da Law Enforcement Against Prohibition (LEAP) e do Corpo Freudiano

Um comentário sobre ….não passarão, por Rubens Casara….

  1. Lívia Marcele Ribeiro 21 de abril de 2012 - 21:30 #

    Na minha cidade as pessoas não têm características fascistas.As pessoas não passam fome como os depentendes químicos do Rio de Janeiro os quais utilizam drogas por causa disto.