….liminar em Ação Civil Pública proíbe revista vexatória em presídio de SP….

Juiz proíbe revista vexatória
em presídios de Itirapina (SP), em Ação Civil Pública movida pela Defensoria
Decisão da 1ª Vara do Foro
Distrital de Itirapina, proferida pelo juiz estadual Felippe Rosa Pereira,
concedeu medida liminar em Ação Civil Pública ajuizada pela Defensoria Pública
do Estado de SP*, proibindo as revistas vexatórias nas Penitenciárias I e II,
localizadas na cidade.

 

A decisão está fundada na Lei
Estadual 15.552/14, que entrou em vigência em 12/08/14 e na transposição do
prazo de 180 dias para sua regulamentação. O juiz entendeu que as disposições da
lei são autoaplicáveis e que o prazo de transição, para a adoção de
providências administrativas, também já se exauriu há meses.

 

Com base nisso, determinou ”que os Diretores das Penitenciárias I e II
de Itirapina se ABSTENHAM de realizar, através do corpo de agentes de
segurança, qualquer procedimento de revista nos visitantes que, nos termos da
fundamentação, englobem o desnudamento do seu corpo, a realização de
agachamentos ou saltos ou mesmo exames clínicos invasivos, a partir de
3/6/2015. Por outro lado, remanesce legítima, de acordo com o comando legal
mencionado alhures, a adoção de qualquer meio de revista mecânica e, em caso de
fundada suspeita e insistência no ingresso, o seu encaminhamento a
“ambulatório onde um médico realizará os procedimentos adequados para
averiguar a suspeita
“.

 

Leia abaixo a íntegra da
decisão

 

 

 

Vistos.

 

1) Aceito a conclusão às 18h21min do dia
3/6/2015.

 

2) A Defensoria Pública do Estado de São
Paulo ajuizou ação civil pública em face da Fazenda Pública do Estado de São
Paulo. Sinteticamente, depois de fazer minucioso levantamento das condições das Penitenciárias
I e II de Itirapina, asseverou que está em vigência a Lei Estadual nº
15.552/2014, que proibiu a realização de “revistas íntimas”.

 

Alegou que, a despeito disso, os visitantes
que se dirigem aos estabelecimentos prisionais em questão ainda são submetidos
a tal procedimento, o que caracterizaria, além de ilegalidade, evidente
violação à dignidade da pessoa humana.

 

Requereu o acolhimento do pedido, inclusive
em sede liminar, para que os responsáveis se abstenham de “realizar a
revista íntima, com as violações já apontadas, em todos os visitantes de presos
custodiados nas Penitenciárias I e II de Itirapina” (fl. 41). Juntou farta
documentação à exordial (fls. 43/194).

 

O Ministério Público (fl. 196), em seu
parecer, manifestou-se pela parcial concessão da medida antecipatória, para que
“a Penitenciária Ii de Itirapina, desde logo, se abstenha de adotar
procedimento que obrigue o visitante a despir-se, fazer agachamento ou dar
saltos ou submeter-se a exames clínicos invasivos, nos termos do mencionado
artigo, sem prejuízo, evidentemente, da aplicação, também imediata, do disposto
no art. 4º da mesma Lei Estadual nº 15.552/2014″.

 

É o relato do essencial.

 

FUNDAMENTO E DECIDO.

 

A liminar deve ser concedida em parte.

 

Os argumentos sustentados pela Defensoria
Pública do Estado de São Paulo – e corroborados, ao menos em parte, pelo
Ministério Público – são idênticos àqueles apostos no mandado de segurança nº
0000155-08.2015.8.26.0283, que tramita perante este Foro Distrital de
Itirapina, impetrado por Vera Lúcia Costa Gama.

 

E, desde aquela ocasião, venho sustentando
que a vedação ao procedimento mencionado na inicial é, antes de tudo, uma
questão de legalidade. Isso porque, em 12 de agosto de 2014, entrou em vigor a
Lei Estadual nº 15.552/2014, responsável por proibir, logo em seu art. 1º, que
os estabelecimentos prisionais do Estado realizem, indistintamente, revistas
íntimas nos visitantes, estas compreendidas, de acordo com o art. 2º, III,
“1” a “3”, como todo e qualquer procedimento que os obrigue
a “despir-se”, “fazer agachamentos ou saltos” ou, ainda,
“submeter-se a exames clínicos invasivos”.

 

É bem verdade que o art. 5º da mesma
legislação concedeu ao Poder Executivo “prazo de 180 (cento e oitenta)
dias a contar de sua publicação” para expedir um “regulamento”.
Porém, o dispositivo sofre com a má-redação legislativa, pois os arts. 1º e 2º
– que, em tese, deveriam ser “regulamentados” – são autoaplicáveis,
revelando, com clareza e exatidão, a mens legislativa.

 

Na realidade, parece-me que a intenção do
legislador era a de estabelecer um “período de transição” – este
absolutamente razoável, diga-se passagem – imprescindível à adoção das medidas
necessárias à aquisição do maquinário e treinamento de pessoal para que os
visitantes passassem a ser submetidos a outros mecanismos de segurança, menos
invasivos que aqueles estipulados pela Resolução SAP nº 144/2010.

 

A dizer, então, durante esse prazo a
manutenção das propaladas “revistas íntimas” não violava a Lei.
Ocorrém, porém, que a Lei entrou em vigor em 13 de agosto de 2014 e o prazo de
180 dias findou em 9 de fevereiro de 2015, sendo que, desde então, não foram
adquiridos ou instalados os equipamentos necessários ao cumprimento da
determinação explícita do legislador. Ou seja, vão-se quase 4 meses com a
manutenção – já adianto ilegal – do procedimento estipulado pela Resolução SAP
nº 144/2010.

 

Noto que foi o próprio Estado de São Paulo,
pelos representantes eleitos pelo povo paulista, que estipulou a necessidade de
por fim às visitas íntimas, aderindo a um processo paulatino compartilhado por
outras Unidades da Federação e pela União. E foi o próprio Estado que estipulou
o prazo necessário para a adoção dos procedimentos imprescindíveis à execução
dessa opção. Esse prazo esgotou-se e nada foi feito. Por isso, não há mais como
aceitar qualquer outra justificativa a emperrar ou postergar, de forma
indefinida, sua aplicação.

 

Leia-se bem: não afirmo, com isso, que o
procedimento seja ou não (in)constitucional, por ferir a garantia da dignidade
da pessoa humana. E nem que concordo, ou não, com a necessidade de adotar
mecanismos mais modernos para a fiscalização da entrada de substâncias ilícitas
nos estabelecimentos prisionais do Estado.

 

Todas essas ilações se tornaram, para todos
os efeitos, desnecessárias e irrelevantes, dada a literalidade e a
imperiosidade da legislação estadual vigente. Parece-me óbvio que vivemos num
Estado Democrático de Direito. E, neste, cumpre-se – ou, pelo menos, deveriam
ser cumpridas – as Leis. E, no caso concreto, a matéria é regulada especificamente
pela legislação estadual, de forma absolutamente discrepante das normas
administrativas que, até hoje, regulam o ingresso de quem quer se seja nas
Penitenciárias. E, havendo tal conflito, soa inviável privilegiar o segundo em
detrimento da primeira, hierarquicamente superior.

 

Por mais que o Eg. TJ/SP ainda não tenha se
manifestado sobre o assunto, constatei que em julgados recentes a Corte vem
reafirmando, obliquamente, a aplicabilidade da novel legislação. É o caso, por
exemplo, do acórdão proferido no julgamento do recurso nº
7011694-65.2014.8.26.0482 pela 3ª Câmara de Direito Criminal, datado de
27/1/2015, no qual o relator, Des. Toloza Neto, asseverou que: […] “não
apenas o artigo 18 do Estatuto da Criança e do Adolescente ressalta que o menor
deve ser colocado a salvo de tratamento vexatório, como também, com a recente
promulgação da Lei nº 15.552/14, em vigor desde 13 de agosto de 2014, houve
proibição desta modalidade de revista em todo e qualquer tipo de situação. Em
outras palavras, embora a referida lei ainda esteja no prazo de sua
regulamentação pelo Poder Executivo, já tendo sido publicada e estando em
vigor, não mais se admite a revista íntima consistente em fazer com que o
visitante retire a roupa e realize agachamentos ou saltos, bem como seja
submetido a exames clínicos invasivos”.

 

Duas ressalvas, contudo, são imprescindíveis.

 

Primeiro, que com a concessão da liminar
nesta ação civil pública, somente ficará obstado que os responsáveis pelas
Penitenciárias I e II de Itirapina submetam os visitantes a qualquer
procedimento de revista, conduzido por agentes de segurança penitenciária, que
envolvam o seu desnudamento, ainda que parcial, a realização de agachamentos ou
saltos ou, ainda, a realização de exames clínicos invasivos (art. 2º, I, II e
III da Lei Estadual nº 15.552/2014).

 

Ou seja, não se trata de propiciar o
“livre acesso” às dependências das Penitenciárias, o que seria
absolutamente irresponsável. Os visitantes poderão (para não dizer deverão) ser
submetidos à revista mecânica, através de detectores de metais, aparelhos de
raios X ou equivalentes (art. 3º). Se, depois disso, ainda persistir fundada
suspeita de que estejam portando objetos ilícitos, poderá a autoridade
penitenciária adotar quaisquer das medidas do art. 4º da Lei em questão, a
saber: (a) repetição da revista mecânica, preferencialmente através de
equipamento distinto; (b) vedação do acesso à unidade e, em caso de insistência
da interessada, o seu encaminhamento a “ambulatório onde um médico
realizará os procedimentos adequados para averiguar a suspeita”.

 

A segunda ressalva que faço – até por conta
do consequencialismo e da accountability que devem nortear as decisões
judiciais – é que tal decisão passará a ser exigível apenas a partir da próxima
sexta-feira (dia 5 de junho de 2015), não produzindo efeitos imediatos já no
dia de amanhã.

 

Embora pouco usual, a postergação é
necessária pelas circunstâncias do caso concreto, que passo a expor ainda que
resumidamente. Tal como mencionei no item “1”, o processo veio à
conclusão em adiantado horário, às vésperas de um feriado prolongado. Dessa
forma, ainda que a Oficial de Justiça parta do Fórum neste minuto, ainda assim
encontrará, nas penitenciárias, o setor administrativo já fechado. Ou seja, na
prática, não haverá tempo hábil para que os Diretores tomem as medidas
necessárias ao cumprimento desta decisão já no dia seguinte, o que, certamente,
ensejará um dos três males: (a) a decisão será descumprida; (b) será autorizado
o ingresso livre de todo e qualquer visitante; ou, (c) haverá tumulto dentro (e
fora) das unidades penitenciárias em função do atraso do início das visitas.

 

Não é possível combater uma medida pouco
razoável com outra de igual natureza. Faz-se necessário assegurar que os
Diretores tenham prazo mínimo para reorganizar os serviços e instruírem, ainda
que com agilidade, os agentes de segurança penitenciária. E é isso que, neste
momento, determino.

 

Ante o exposto, CONCEDO EM PARTE A LIMINAR
para DETERMINAR que os Diretores das Penitenciárias I e II de Itirapina se ABSTENHAM
de realizar, através do corpo de agentes de segurança, qualquer procedimento de
revista nos visitantes que, nos termos da fundamentação, englobem o
desnudamento do seu corpo, a realização de agachamentos ou saltos ou mesmo
exames clínicos invasivos, a partir de 3/6/2015. Por outro lado, remanesce
legítima, de acordo com o comando legal mencionado alhures, a adoção de
qualquer meio de revista mecânica e, em caso de fundada suspeita e insistência
no ingresso, o seu encaminhamento a “ambulatório onde um médico realizará
os procedimentos adequados para averiguar a suspeita”. 2) Serve esta como
mandado, ficando a Oficial de Justiça autorizada a efetuar a intimação na
pessoa de cada responsável pelo plantão noturno, caso o Diretor não esteja
presente no local no ato da diligência. 3) No mais, cite-se o Estado de São
Paulo por carta precatória. Intimem-se.

 

 

 

 

*A
ACP é subscrita pelos Defensores Públicos Vinicius da Paz Leite, Arthur Rega Lauandos, Adriano
Pinheiro Machado Buosi, Maria Auxiliadora Santois Essado, Patrick Lemos
Cacicedo, Bruno Shimizu e Verônica dos Santos Sionti

 

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