Direitos Humanos não são perfumaria; bibelôs de enfeite ou retórica. É aquilo para o qual o Estado deve agir e sem o quê o desenvolvimento é vazio
Milhares de pessoas em vários cantos do Brasil saíram às ruas para protestar contra a eleição do pastor e deputado Marco Feliciano (PSC-SP) para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias, da Câmara dos Deputados.
Com plataforma típica de uma conservadora bancada evangélica e posições peculiares como a “ditadura gay” e o “continente africano amaldiçoado”, o lado irônico de sua escolha acabou submerso pelo receio de um atraso sem precedentes.
Sua eleição, todavia, não deve ser vista apenas como a causa, mas também o sintoma deste retrocesso.
O fato é que Direitos Humanos virou uma comissão de terceira categoria.
Não interessa ao governo e nem a maioria dos partidos que a ele fazem oposição.
Não à toa, nem PT, nem PSDB quiseram presidi-la ou lutar por sua composição e direção.
É como se os grandes partidos dissessem que existem questões mais importantes a tratar.
A mensagem que passa à sociedade é a de que direitos humanos não são assuntos de governo –mas temas de ativistas. Pior agora, feudo de bancada religiosa que nela se apega para impedir que o mundo caminhe para frente.
Esse conservadorismo atroz no qual o Congresso vem se afundando, com uma enorme pitada de corporativismo, fez com que em temas sociais até o Judiciário, poder conhecido por seu tradicionalismo, virasse vanguarda, como no casamento gay.
Hoje, no Estado de São Paulo, por determinação da Corregedoria-Geral da Justiça, todos os Cartórios de Registro Civil já estão devidamente instruídos para habilitar os pretendentes ao casamento, independente do sexo.
A questão que vai se transformando em lei em vários países do mundo ocidental, ainda é tratada como tabu no Congresso.
Felizmente, para a nossa sorte, a abolição da escravatura já se fez, porque é bem provável que tivéssemos dificuldade similar a que o presidente Lincoln encontrou no cenário americano do século XIX.
É preciso compreender que direitos humanos não são perfumarias.
Não são apenas bibelôs de enfeite ou questões de retórica.
São aquilo para o qual os governos existem, sem o quê o desenvolvimento é vazio.
É preciso formar, nos diversos Poderes, agentes que tenham o respeito aos direitos humanos como uma obrigação primeira –não apenas estandarte, mas política pública.
Nos concursos à magistratura, por exemplo, já inserimos até literatura e conhecimentos gerais, mas resistimos a uma disciplina que exija dos candidatos questões sobre tratados e convenções internacionais. Muitos direitos deixam de ser reconhecidos, justamente por não serem conhecidos.
O Executivo, sobretudo, deve repelir a máxima dos governos da ditadura, que vez por outra ainda seduzem conservadores tardios: não é preciso esperar crescer o bolo para tutelar direitos.
Torturas policiais, submissão da mulher, crimes de ódio, violência homofóbica.
Se ainda discutimos o reconhecimento e a gravidade desses temas, é sinal de que mesmo depois desse, outros parlamentares virão para consagrar novas omissões de direitos humanos.
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