a melhor forma de desestimular a violência é jamais premiá-la
Poucas vezes na trajetória de torcedor fiquei tão indiferente a uma derrota do meu time. Ou melhor, até satisfeito com ela.
Depois dos atos de selvageria no Centro de Treinamento durante a semana, tudo o que não podia acontecer ao Corinthians domingo era os supostos ‘torcedores’ concluírem que estavam com a razão em seu brado além do insano: “se não for por amor, vai ser pelo terror”.
Esses agressores torcem conceitos e distorcem princípios.
Tal como violadores domésticos, sentem-se donos do objeto de seu desejo. Podem ser possessivos e esbulhadores, orgulhosos ou egoístas. Mas não são amantes de seu time.
Quem ama não maltrata, não subjuga, não submete.
São apenas distorcedores.
Produtos da promiscuidade própria da administração do futebol, quase sempre linha auxiliar de dirigentes.
Arrogam-se uma autoridade sobre os times que nunca tiveram, nem devem ter.
Não bastasse imporem medo aos demais torcedores, diante de cenas brutais de violência que se repetem a cada jogo decisivo, agora passam a impor o terror a profissionais a quem tratam como reféns.
Esses distorcedores são filhos naturais do patrimonialismo que reina no futebol, pródigo na apropriação privada do que é coletivo –e não apenas no Corinthians, pois cenas de agressões a torcedores e jogadores vem se repetindo em vários clubes.
Em entrevista à Folha de S. Paulo, o presidente da Gaviões da Fiel compara os protestos de torcedores às manifestações de junho do ano passado e arremata com o desvalor de quem trata a violência com naturalidade: Quem já não deu um murro na cara de outro?
Nada há de libertário nesta agressividade.
Bater para mostrar quem manda é apenas expressão de um fascismo sem causa, que comprime e jamais prestigia a liberdade.
É verdade que as torcidas profissionais são estimuladas pelos clubes e ainda pela televisão que se vale de seus cantos e suas coreografias para vender fortes emoções a cada fim-de-semana.
Mas isso não lhes dá o direito de se apropriar das paixões coletivas ou de impor regras a quem joga e quem assiste.
A novidade na equação é o uso cada vez mais corriqueiro da violência como forma de expressar um poder que não detêm. E ganhar na marra uma distorcida agenda do futebol.
Destruir veículos, danificar painéis, subtrair telefones, esganar jogadores –nada disso é um direito do torcedor.
Que ele faça greve e se recuse a ir ao estádio, que vaie ou não compre mais camisas. Desista de sua paixão, se não se sentir correspondido. Mas não a imponha no murro.
Já é passada a hora de a administração e o negócio do futebol acordarem: a melhor forma de desestimular a violência é jamais premiá-la
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