….o poema que comprei por mil pesos….

Eu, Neruda e uma jovem poeta, em Santiago.

Quando estava na porta de “La Chascona”, casa-museu de Pablo Neruda, em Santiago, uma jovem se aproximou, oferecendo um papel, como o folheto qualquer de propaganda. Peguei apenas por educação, agradeci sorrindo e continuei a andar.

-É uma poesia, ela me disse quase aos gritos, quando já me afastava.

Olhei, então, o papel que trazia versos mimeografados, em inglês e em espanhol. Mi Jardin (My Garden). E antes que pudesse perguntar, ela acrescentou, quase ofegante, após ter apressado o passo para me alcançar:

-Somos estudantes. Fazemos poesia. E pedimos uma pequena contribuição, em troca do poema. Para que possamos continuar a escrever.

Fosse o fato de ter ficado sem graça por já ter pego o papel, pelo qual ela me pedia uma contribuição, fosse pelo espírito de Neruda, que batia à porta, em nome do qual não se devia negar o pedido de um poeta justamente para continuar a escrever, dei-lhe uma nota de mil pesos.

Mas, confesso, só depois de sair de Chascona, é que fui ler. Coincidentemente após fazê-lo, lá estava de novo a mesma jovem pronta a entregar outro papel.

Sorri, como a lhe dizer que já havia recebido o poema, e mais ainda contribuído por ele. Mas ela não se lembrou de mim. Os turistas devem ser todos iguais. Principalmente aqueles que fogem apressados de pedintes, entregadores de folhetos ou da ameaça inclemente de jovens poetas.

Mas ela não. Ela não era igual. E fosse mesmo seu o jardim, ou o jardim de um outro poeta, o fato é que foi ela e não Pablo que, naquele dia, me fez ler poesia.

Só isso já bastaria para fazer esse registro.

Mas quer saber?

Eu até gostei e passei a tratar aquele também como o ‘meu jardim’.

Para a jovem, que me chamou a atenção, por ousadia ou desespero, compartilho aqui os versos pelos quais paguei mil pesos. Eu não sei se os versos são dela. Mas agora, com certeza, são meus também.

Mi jardin.

Porque al sentirse solo,
Pienso en ti
Te recuerdo como la alegría de primavera
tus labios eran las profundidades de nuestro sentir
Tus ojos reflejan armonia esa la que perdi
Porque tu amor fue veridico, lo vivi
Princesa de me sentimiento
Mariposa de mis flores, de muchos colores
Que hoy veo en mi jardin
El canto de las aves me recuerdan tu reir
Hoy estoy solo, pero es cuando mas me acuerdo
De ti

2 Comentários sobre ….o poema que comprei por mil pesos….

  1. Anônimo 7 de novembro de 2010 - 17:50 #

    Já seja por ter permitido que você tivesse lido um poema diante da casa de Neruda ou simplesmente pelos próprios versos, valeu ter pago 1.000 pesos… os versos são lindos e para mim encantadores.. não sei se pela historia ou por eles mesmos… mas o fato é que são lindos! obrigada por partilhar. Renata

  2. Marcelo Semer 7 de novembro de 2010 - 22:45 #

    Eu que agradeço, Renata, não só pelo seu interesse, como pelas gentis palavras. Os versos são lindos mesmos, valem muito mais que "pesam".