O rebaixamento do debate, a política virulenta, a banalização da violência e a criação de párias são o ovo de serpente do fascismo
Se você não entendeu a piada de Rafinha Bastos afirmando que para a mulher feia o estupro é uma benção, tranquilize-se.
O teólogo Luiz Felipe Pondé acaba de fornecer uma explicação recheada da mais alta filosofia: a mulher enruga como um pêssego seco se não encontra a tempo um homem capaz de tratá-la como objeto.
Se você também considerou a deputada-missionária-ex-atriz Myriam Rios obscurantista ao ouvi-la falando sobre homossexualidade e pedofilia, o que dizer do ilustrado João Pereira Coutinho que comparou a amamentação em público com o ato de defecar ou masturbar-se à vista de todos?
Nas bancas ou nas melhores casas do ramo, neo-machistas intelectuais estão aí para nos advertir que os direitos humanos nada mais são do que o triunfo do obtuso, a igualdade é uma balela do enfadonho politicamente correto e não há futuro digno fora da liberdade de cada um de expressar a seu modo, o mais profundo desrespeito ao próximo.
O moderno reacionário é um subproduto do alargamento da cidadania. São quixotes sem utopias, denunciando a patrulha de quem se atreve a contestar seu suposto direito líquido e certo a propagar um bom e velho preconceito.
Pondé já havia expressado a angústia de uma classe média ressentida, ao afirmar o asco pelos aeroportos-rodoviárias, repletos de gente diferenciada. Também dera razão em suas tortuosas linhas à xenofobia europeia.
De modo que dizer que as mulheres – e só elas – precisam se sentir objeto, para não se tornarem lésbicas, nem devia chamar nossa atenção.
Mas chamar a atenção é justamente o mote dos ditos vanguardistas. Detonar o humanismo sem meias palavras e mandar a conta do atraso para aqueles que ainda não os alcançaram.
No eufemismo de seus entusiasmados editores, enfim, tirar o leitor da zona de conforto.
É o que de melhor fazem, por exemplo, os colunistas do insulto, que recheiam as páginas das revistas de variedades, com competições semanais de ofensas.
O presidente é uma anta, passeatas são antros de maconheiros e vagabundos, criminosos defensores de ideais esquerdizóides anacrônicos e outros tantos palavrões de ordem que fariam os retrógrados do Tea Party corarem de constrangimento.
Não é à toa que uma obscura figura política como Jair Bolsonaro foi trazida agora de volta à tona, estimulando racismo e homofobia como direitos naturais da tradicional família brasileira.
E na mesma toada, políticos de conhecida reputação republicana sucumbiram à instrumentalização do debate religioso, mandando às favas o estado laico e abrindo a caixa de Pandora da intolerância, que vem se espalhando como um rastilho de pólvora. A Idade Média, revisitada, agradece.
Com a agressividade típica de quem é dono da liberdade absoluta, e o descompromisso com valores éticos que consagra o “intelectual sem amarras”, o cântico dos novos conservadores pode parecer sedutor.
Um bad-boy destemido, um lacerdista animador de polêmicas, um livre-destruidor do senso comum.
Nós já sabemos onde isto vai dar.
O rebaixamento do debate, a política virulenta que se espelha no aniquilamento do outro, a banalização da violência e a criação de párias expelidos da tutela da dignidade humana.
O reacionário moderno é apenas o ovo da serpente de um fascismo pra lá de ultrapassado.
Preciei imensamente esse seu comentário. Parabéns. Tomei a liberdade de colá-lo em meu blog http://www.domomb.blogspot.com Muito obrighado. Abraços e continue, Dom Orvandil
Caro Dr. Marcelo Semer,
Vou logo confessando, tomei um porre de seus escritos e falas, li seu artigo, via blog do Nassif, acessei seu sitio, vi sua entrevista a Sílvia Vinhas, comecei a ler seu livro, no link do google books, e fui até onde foi permitido, ou seja, vou ter que continuar mais tarde numa livraria.
Olha, foi um prazer ler e conhecer suas idéias, sonhos e relatos de uma geração de nossa história, pois também pertenço a mesma geração, de alguma forma me vi neles, maravilha.
“Eu nunca aceitei que a sobrevivência fosse um valor último. A vida, para ser bela, deve estar cercada de vontade, de bondade e de liberdade. Essas são coisas pelas quais vale a pena morrer”.
Sds e aquele abraço,
Conti-Bosso
Você acredita mesmo que pode haver justiça na desordem? Ou está querendo experimentar para ver como é?
Boa tarde Sr. Marcelo. Lendo o teu artigo, me lembrei dos tempos de faculdade quando li um que alertava para a falta de ideais da juventude europeia. Acho que isso vale para todos. Tive sorte de achar ainda disponível na internet. Come se perceberá, a nossa sociedade faz muita propaganda para levar os cidadãos para um mundo de consumismo sem sentido, escondendo que o fim do homem não está nos meios.
No site: http://www.alfredo-braga.pro.br/discussoes/humanismo.html
Esse é o segredo: bater a carteira e gritar pega ladrão, como disse o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ)sobre os petistas…
Ou, como diria Lênin: "Xingue-os do que você é, acuse-os do que você faz"…
Um partido autoritário, corrupto, que persegue e censura adversários e querendo impingir, aos outros, o rótulo do fascimo…
Onde o Estado domina quase 40% da economia;
Onde o Judiciário virou instrumento de um partido;
E onde as universidades se transformaram em movimentos sociais…
Não, senhor. O fascista aqui é VOCÊ!!!
Marcelo Semer,
li o seu texto no dia em que foi publicado, e desde esse dia ele não me sai da cabeça. Você resumiu muitas coisas que precisavam ser ditas. Aposto que incomodou profundamente algumas pessoas, pois quando confrontadas com a própria degenerescência mental, e com a própria indigência existencial, explicitada claramente no seu texto, aquelas pessoas devem se envergonhar pelo menos um pouco de serem os monstros que são. Se regozijam exercendo o racismo, a homofobia, a covardia de pisar no desfavorecido do alto de suas supostas grandezas, e agora são obrigados pelo seu texto a vislumbrar toda a podridão de seus atos. Mas, já que pau que nasce torto, morro torto, a ressaca moral é fugaz.